Terça-feira, 6 de Dezembro de 2011
Barreiro

No seguimento do artigo denominado “Portugal e a Cultura do Mar” julgo ser oportuno recordar a parte de uma comunicação apresentada no Barreiro durante uma sessão ali realizada pela Academia de Marinha, em 1997, que mais interessa a este assunto e que mostra claramente o imobilismo, pelo menos, daqueles a quem competia e compete criar as condições essenciais para o desenvolvimento sustentado das populações, neste caso do Barreiro, e que era uma antevisão de uma visita aqui realizada em 2007.

 

“A primeira grande conquista no que respeita a actividades marítimas do Barreiro foi o aproveitamento da margem direita do rio Coina para aí instalar uma marina de largas proporções utilizando intensamente na sua concepção estruturas flutuantes que permitiram reduzir custos e impactos ambientais e criar mais de três mil postos de atracação para embarcações de recreio de dimensões diversas desde as mais pequenas, digamos da ordem dos 5m de comprimento, até às de porte mais elevado o que significa cerca de 30m, ou mesmo mais.

 

Associados à marina, como é normal, surgiram programadamente duas escolas de vela ligadas a outros tantos clubes náuticos locais, oficinas de reparação e fabrico de velas alem do grande desenvolvimento da já existente, oficinas de reparação e de manutenção de motores e embarcações, e todo o equipamento indispensável à assistência a embarcações com meios de elevação e deslocação permitindo também em zona mais afastada a armazenagem em terra de embarcações para hibernação.

 

Na zona da marina verifica-se a existência habitual de restaurantes dos mais variados tipos e classes possibilitando uma oferta muito variada não só aos navegadores como aos numerosos visitantes que sempre acorrem a estes locais, bem como muitas lojas também características deste tipo de clientela.

 

Dada a afluência de viaturas foram construídos vários parques de estacionamento alguns deles aproveitando diferenças de nível dos terrenos circundantes para atingir maiores capacidades sem os inconvenientes da ocupação de espaços que merecem utilização mais nobre e mais proveitosa.

 

Não foram também esquecidas as indispensáveis instalações de serviços de socorros e clínicos, aliás colocadas em local estratégico do ponto de vista de fácil acesso, bem como balneários e instalações sanitárias.

 

Ainda na área de influência directa da marina foram construídos dois hotéis de porte médio ( 250 a 300 quartos) e um centro comercial , sendo de notar a solução encontrada para instalar o edificio da gestão da marina e das autoridades marítimas que foi a de utilizar uma plataforma flutuante situada estrategicamente à entrada, isto é, perto da embocadura do rio Coina e ligada a terra por uma passagem flutuante.

 

Embora não houvesse ocasião para visitar ficámos a conhecer a existência de várias unidades de animação para crianças e para adultos todas elas relacionadas com o mar utilizando técnicas modernas que tem enorme poder de atracção sendo simultaneamente educativas.

Para enquadrar tudo isto foram criadas muitas zonas verdes e caminhos pedonais evitando a poluição atmosférica e visual causada pela ocupação por viaturas das zonas nobres.

 

Indo agora para o centro da cidade visitamos o Instituto de Estudos Gâmicos instalado no Convento da Verderena onde se pode apreciar o que de melhor se faz em modelismo náutico e tomar conhecimento do que se tem realizado no campo da formação, do controlo de qualidade e do estudo do próprio projecto dos modelos, além do museu onde se podem observar exemplares excelentes desta actividade.

 

Ainda ligados a esta instituição também se pode tomar conhecimento de diversos trabalhos de investigação nos campos da arqueologia naval e do projecto de novas embarcações de vela.

 

Mais adiante na margem norte junto ao rio pode ver-se o novo “eolodromo” com bancadas para 5 000 espectadores, equipado com sistema de ventiladores que permite realizar treinos e provas de prancha à vela e pequenas embarcações e que se tornou num chamariz de visitantes durante todo o ano dado o clima permitir a sua utilização permanente.

 

No centro da cidade visitámos também uma galeria de pintura especializada no tema de marinha que se tornou no centro mais importante desta actividade no nosso país e já é conhecido no estrangeiro estando ligado a várias organizações internacionais de pintura de marinha.

 

Relativamente perto do terminal fluvial está uma réplica da nau S. Gabriel que não tendo sido possível estar pronta em 1997 para ir à India se conseguiu entretanto construir, com custos muito inferiores uma vez que aqui ficou como museu, e onde se pode ver como estava equipado este navio e como vivia a bordo Alvaro Velho e a tripulação comandada por Vasco da Gama.

 

Mais a montante no rio Coina, pouco afastado da capela de Sto. André, entretanto recuperada, está o estaleiro da Azinheira Velha reconstituído de forma a mostrar como era um estaleiro dos fins do século XV onde a nau S. Gabriel foi construída.

 

Também nesta zona da cidade pudemos visitar o museu da muleta onde estão expostos modelos desta e doutras embarcações típicas deste local e artes de pesca aqui utilizadas em tempos idos e algumas ainda hoje, e mais adiante o museu do bacalhau e da pesca longínqua que como se sabe teve aqui um pólo importante e ainda hoje funciona.

 

No lado nascente da cidade observámos o cais de carga reactivado com movimento de contentores e granéis transportados em navios de cabotagem europeia, muitos já em bandeira portuguesa depois das alterações entretanto regulamentadas pelo governo português que permitiram a existência de armadores nacionais competitivos assim conseguindo reduzir drasticamente os custos e a poluição dos transportes de mercadorias de e para esta região.

 

Ainda na zona dos moinhos de maré um dos quais completamente reconstruído e em que uma das caldeiras foi adaptada a actividades lúdicas apreciámos a torre de Alvaro Velho no topo da qual almoçámos enquanto disfrutávamos da magnífica vista do mar da Palha, de parte da península de Setúbal e de Lisboa que se tem dos seus cento e muitos metros de altura.

 

Junto da torre foi construído un conjunto de casas, réplicas de construções do século XV, onde existem restaurantes, lojas e outros pontos de animação afins, dentro da filosofia de recriar um ambiente renascentista, português e animado.

 

E conforme nos foi esclarecido pelo nosso cicerone tudo o que vimos foi, ou ainda, está a ser pago pelas suas próprias receitas.

 

A falácia de que só é possível o desenvolvimento se houver subsídios foi aqui desmentida, desde que o binómio administração pública/iniativa privada funcione eficientemente.

Muito ficou ainda por ver, mas mais não foi possível apreciar num simples e único dia de Julho de 2007.

 

Enquanto nos deslocámos de local para local pudemos notar como melhorou o panorama arquitetónico da cidade, os jardins que entretanto se construiram e a influência que houve em toda a população que de facto compreendeu a importância das actividades marítimas na sua própria vida não apenas profissional mas também particular.

 

Os valores dos indicadores económicos e sociais que resultaram destas transformações não quero enfatizá-los para não parecer demasiado politizado embora eu seja totalmente independente, mas é patente ( estou a falar em 2007 ) a subida de nível de vida e de participação activa da população nesta cidade nos últimos dez anos como consequência de haver esta intensidade de actividades marítimas.”

 

Como tudo isto se pode fazer, quanto é preciso investir e tudo o mais não é assunto para vos maçar no fim de um dia cheio como o de hoje.

 

Fique-se no entanto com a ideia que toda esta ficção pode ser verdade.

 

Barreiro, 5 de Julho de 1997”

 

Publicado na Revista de Marinha em Julho de 2011



publicado por JoseViana às 15:15
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