Os acontecimentos recentes Grécia-Europa, que na verdade tiveram origem cerca de vinte anos atrás, mostram a debilidade da gestão europeia e das gestões nacionais quase todas, e levantaram alarmes quanto à democraticidade vigente que põe em causa a própria sobrevivência da Comunidade. E a proximidade das eleições que aí vão chegar motivaram este meu desabafo.
Julgo não haver qualquer dúvida de ser a democracia o regime que os países devem escolher para a sua organização política.
E também não tenho qualquer dúvida de que os países, aliás como qualquer outra organização, têm que ser governados, e aqueles que os governam, isto é os seus Órgãos de Soberania devem atuar com a máxima eficiência, inclusive utilizando todos os conhecimentos e as práticas da gestão eficiente.
Mas não podemos ignorar que as principais forças que movem as populações são a luta pela sobrevivência e a luta pelo poder e quando a primeira está amortecida pela boa qualidade de vida e/ou pela facilidade de crédito, fica excessiva a dependência da população ao poder político se este não estiver sujeito a sistemas efetivos de controle pelos eleitores.
Assim se explica o que aconteceu nestas últimas décadas: após a nossa adesão à Comunidade Europeia, que tinha atingido elevado nível, quer de vida quer social, graças ao desenvolvimento económico após a aplicação do Plano Marshall que injetou muitos milhões a serem pagos a longo prazo após a guerra de39-45, Portugal foi invadido por dinheiro fácil proveniente de subsídios europeus para ajudar o país a desenvolver-se e assim se aproximar dos níveis dos países fundadores e de empréstimos bancários com juros baixos.
Mas a orientação dos responsáveis nacionais optou por despesas sem objetivos produtivos, pelo incremento de intermediários parasitas, por melhoramentos em infraestruturas úteis mas muitas vezes exagerados, por pouca valorização do fator humano, pelo comprometimento exagerado dos cidadãos em créditos para consumo, enfim em cada ano o OGE mostrava o crescimento sistemático das dívidas e a constância do PIB até que se atingiu a proximidade da bancarrota e portanto ao início da perda da nossa independência, depois consubstanciada pelo programa neoliberal do Governo.
Assim se no século XV fomos o país que iniciou o colonialismo praticado pelos europeus agora somos o país que iniciou o autocolonialismo, isto é nós próprios entregarmos a colonos estrangeiros componentes essenciais da nossa independência, em nome da privatização!
O que mostra claramente ter sido ofendido o princípio constitucional que diz serem os Órgãos de Soberania responsáveis pela independência nacional! Mas curiosamente nenhum deles durante estes quase vinte anos de desvios de rumo deu sinais para os corrigir.
Entretanto convém não esquecer que muitos daqueles que mais obrigação tinham de conhecer o evoluir da situação estavam a enriquecer e assim certamente não estariam motivados para mudanças de rumo pouco produtivas do ponto de vista pessoal, e ainda por cima sendo dada como causa principal das dificuldades surgidas: o Euro!
Durante este período foi aumentando o afastamento entre os políticos e os eleitores revelado nas eleições pela percentagem das abstenções embora com algumas demonstrações ocasionais de ações de protesto na rua.
Mas na verdade não houve em caso algum qualquer controle das ações políticas pelos eleitores que pudessem evitar os enormes desvios entre o que era prometido durante as campanhas eleitorais e o que era de facto realizado, pois não havia nem há agora qualquer meio eficaz para que isso pudesse ser realizado.
Para se poderem corrigir estes erros, que tiveram consequências catastróficas para a população, há dois tipos de medidas a saber:
1º-Evitar erros de organização das estruturas soberanas como seja por exemplo não haver oposição de poderes em vez concordância de poderes.
Vejamos dois exemplos: o primeiro é o da eleição do Provedor que deveria ser eleito “apenas” pela oposição e ter o seu mandato coincidente com o da Assembleia; o segundo é o caso do Ministro do Ambiente que deveria ser essencialmente um regulador e um fiscalizador o que do ponto de vista organizativo nunca aceitaria gerir a Energia pois esta coincidência de poderes foi a causa do desastre de Chernobil, pois um fiscalizador eficiente nunca deve ser um operador.
Aliás esta oposição de funções de índole controladora já existe potencialmente entre o Presidente da República e o Governo/a Assembleia uma vez que entre o Governo e a Assembleia no sistema atual não há praticamente qualquer oposição de funções.
Direi mesmo que parece faltar outra Câmara, tipo Senado, onde estivessem representadas as forças produtivas diretas como acontece em ponto pequeno com o Conselho de Concertação Social.
A realidade da nossa organização estatal global, isto é, incluindo os órgãos centrais e as autarquias, aconselha dever ser revista profundamente a fim de corrigir as elevadas perdas de produtividade e o aumento de gastos não produtivos. Uma reforma do Estado a sério.
2º-Na verdade não se pode dizer que não há qualquer contacto entre o poder político e a população pois nos partidos existe bastante ligação entre as chefias e os respetivos partidários. Mas isso representa uma percentagem pequeníssima da população e a experiência mostrou a sua inutilidade do ponto de vista de controle nesta crise que estamos a viver.
Por outro lado a atuação da Comunicação Social deixa muito a desejar pois verifica-se haver assuntos essenciais, como por exemplo este da independência nacional, ou a destruição da nossa Marinha, que nunca mereceram a atenção devida à sua importância.
Portanto como poderão os eleitores ter a garantia de que a delegação de poderes que pela eleição é dada aos políticos que as ganham é devidamente cumprida?
Não podemos esquecer que a delegação de poderes em alguém não é para esse alguém fazer o que lhe apetece mas apenas totalmente aquilo a que se comprometeu para receber a delegação.
Já apareceram iniciativas como a TIAC, a que aderi, que representa uma mais valia importante na nossa sociedade mas que ainda não chega para se conseguir intervir de forma a evitar os desvios verificados nas últimas décadas.
Penso que através das redes sociais, ou meio equivalente que possa ser criado, se conseguirá exercer a pressão coletiva que complemente a das eleições que tão pouco ou nada serviu no passado recente e cujas consequências gravosas para os portugueses tanto tempo ainda vai ser preciso para serem corrigidas.
Lisboa, 2015-08-06