Domingo, 10 de Fevereiro de 2013
O acordo ortográfico e o cidadão interessado

 Desde há muitos anos que leio vários artigos sobre a questão do acordo ortográfico e, não tendo qualquer dúvida quanto à importância da língua portuguesa nas ligações com todos os aglomerados populacionais que falam português por esse mundo fora, ainda não tomei conhecimento completo da razão pela qual chegámos à situação atual de haver três ortografias possíveis.


Segundo o excelente artigo publicado há dias no DN pelo Prof. Vasco Graça Moura há em Portugal o correspondente ao acordo que nós aceitámos, há em Angola e Moçambique o que nós tínhamos antes e há no Brasil o deles. Quem quiser saber mais deve ler o artigo atrás mencionado.


Perante tal confusão resolvi realizar uma busca que, embora pouco académica, talvez já possa dar-me alguma ideia da explicação para esta situação, e assim procurei saber o que tinha acontecido com as línguas espanhola, francesa e inglesa, cujos países de origem tinham tido também impérios coloniais e as suas línguas usadas em vários países hoje independentes.


Em nenhum deles a história da evolução da sua língua fala de acordos ortográficos e respetivas polémicas mas em compensação parece ter havido, particularmente a partir do início do século XIX o desenvolvimento de editoras privadas situadas nos países de origem que forneciam todos os livros necessários para as populações das antigas colónias.


Desta maneira simples passou a haver suficiente uniformidade da escrita respetiva e assim não se justificou a necessidade de qualquer acordo ortográfico nem de interferências governamentais neste assunto.

Só na língua inglesa houve algumas diferenças entre os Estados Unidos e a Grã-Bretanha que levou Bernard Shaw a afirmar que estes dois países eram muito parecidos exceto na língua.


Recordando a história de Portugal e do Brasil verifica-se que ao chegar ao Rio de Janeiro em 1808 D. João VI encontrou um país em plena idade média que rapidamenteiniciou uma fase de desenvolvimento em todos os setores incluindo o do ensino e portanto do consumo de livros e de jornais.

 

Acontece que neste período Portugal era invadido pelas tropas de Napoleão que depois tiveram que ser expulsas, ao que se seguiram as lutas entre liberais e absolutistas e assim o País esteve em enorme perturbação e instabilidade das quais só foi melhorando em meados deste século XIX, mas que continuou sempre impeditiva de ações mais profundas.

 

Não é pois de estranhar a ausência de editoras portuguesas no mercado brasileiro, como aconteceu com os países atrás indicados, razão pela qual apareceram ali várias editoras que naturalmente adotaram a língua que mais de adaptava aos condicionalismos locais. E assim se formou o “português” do Brasil.

 

Como a diferença de dimensão entre o português e o brasileiro é enorme, o que quem nunca viveu no Brasil pode ter alguma dificuldade em entender, o crescimento da atividade literária e científica neste país originou a necessidade de utilizar termos, quase sempre no início para traduzir autores estrangeiros, e assim se desenvolveu uma língua baseada no português mas naturalmente com diferenças na ortografia e na pronúncia.

Mas por muito que isso custe a alguns portugueses a produção editorial brasileira passou a ser de tal modo que muitas vezes se queria  estudar alguns assuntos, originalmente em línguas estrangeiras, em português tinha que adquirir edições brasileiras.

 

Por outro lado o Brasil tem quase vinte vezes mais praticantes da sua língua que Portugal e a aprendizagem desta por estrangeiros é mais fácil, razão pela qual estes dão natural preferência ao português do Brasil.

 

Os portugueses não só não foram capazes de aproveitar as enormes riquezas herdadas de D. João II mas também não conseguiram concretizar as iniciativas empresariais que lhe possibilitariam agora não ser preciso um acordo ortográfico praticamente impossível a menos que seja de acordo com o Brasil. E isto pouco tem a ver com o Governo pois trata-se essencialmente de uma questão da sociedade civil e em particular da nossa iniciativa empresarial, tradicionalmente fraca e muito encostada aos apoios do Estado.

 

Aliás um País que tinha a sua independência e a sua soberania assentes na Marinha e em que a sua sociedade civil aceitou pacificamente a destruição desta, não tem agora grande razão para tanta preocupação com a ortografia.

Publicado no DN em 1 de Abril de 2013

 

Lisboa, 21 de Janeiro de 2013



publicado por JoseViana às 22:54
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