Têm sido muito comentadas as consequências funestas para a economia deste país as várias PPP (Parcerias, Público-Privadas) que foram criadas para se conseguirem realizar projetos, muitos deles de utilidade duvidosa, fugindo ao controle que deveria haver mais eficiente, e garantindo aos nossos filhos e netos uma sobrecarga de dívidas para muitos anos, além da contribuição para o desequilíbrio atual..
Foram de facto péssimas as decisões que tornaram reais estas situações, mas deve perguntar-se: quem as tomou?
Ora ainda há dias na comunicação social aparecia a informação de que cerca de 78% da despesa total do nosso Estado é constituída por pensões e custos de pessoal dele dependente, razão pela qual o atual Governo, para atingir os valores que permitirão termos acesso ao crédito, que é essencial para sobrevivermos, se viu forçado aos cortes que até alguns partidos políticos, com enorme responsabilidade nesta situação, tanto criticam.
É preciso não esquecer que para lhes pagar é indispensável cobrar mais impostos o que significa tornar menos competitivos aqueles que produzem e criam riqueza (e que são poucos) o que nos faz cair numa espiral de perda crescente, como se pode verificar pelo valor enorme das dívidas acumuladas.
Voltando à pergunta formulada dois parágrafos atrás: quem as tomou?
E já agora mais outra pergunta: e quem constitui a parcela não produtiva da nossa população que provoca todo este desequilíbrio?
A resposta a ambas é: os PPP.
Ou seja: os Partidos Políticos e os Parasitas.
Os primeiros porque em democracia, que todos tanto apregoam, devem ser eles a preparar pessoas competentes e honestas para ocuparem os cargos inerentes ao exercício do poder, sempre devendo ter como objetivo essencial o bem do país e não apenas o bem do partido ou de alguns dos seus membros, poder esse obviamente conseguido em eleições, em que seria desejável toda a gente participar.
Porque não o fazer, isto é abster-se, é próprio de regimes ditatoriais. Ou então consequência de falta de aproximação dos partidos à população e sinal de baixa eficiência dos responsáveis por esses partidos.
Da mesma forma que a dificuldade de os partidos em apresentarem candidatos com o nível de qualidade correspondente á importância dos cargos a preencher também resulta de falha gravíssima desses mesmos responsáveis.
Curiosamente sempre que há eleições e se verifica a enorme abstenção, os políticos aparecem a lamentar-se, e até por vezes a acusar os eleitores de falta de civismo, mas os responsáveis são eles e mais ninguém.
Para ilustrar esta deficiência dos partidos basta recordar a ausência total de vontade política, isto é, dos políticos que estão na Assembleia da República, de legalizar o combate à corrupção começando por estabelecer as regras que devem gerir os conflitos de interesses, e de garantir a eficiência dos órgãos de controle, como por exemplo o Tribunal de Contas, de forma a reduzir, ou eliminar se possível, os casos que se têm verificado com tantos prejuízos para o País.
Além disto verifica-se também que os mesmos partidos, que tanto contribuíram para a situação atual de quase bancarrota do nosso país, e que quando podiam ter alterado o rumo de colisão nada fizeram de positivo, antes pelo contrário ainda agravaram mais os erros e desmandos, agora aparecem na rua a protestar como se estivéssemos outra vez em tempo de ditadura.
De facto na ditadura foi preciso ir para a rua para mudar para a democracia, mas agora não seria preferível os partidos conseguirem ser mais eficientes e mais conscienciosos e resolverem os problemas do País nas eleições e no Parlamento?
E darem provas de que o seu objetivo é melhorar a gestão do País e não apenas a obtenção de benefícios insustentáveis e a satisfação momentânea dos responsáveis das suas organizações corporativas.
Ficam para o fim os Parasitas. Isto é: aqueles que recebem salários ou pensões mas não contribuíram ou contribuem com qualquer atividade que justifique esse pagamento.
Aqueles que estando ainda no efetivo, e que é a maior parcela, mas em nada contribuem para a riqueza do país, dividem-se em dois grupos: os que não têm qualquer responsabilidade por se encontrarem em tal situação e para quem há que encontrar outras funções úteis e os que por razões de compadrio político ou outro se instalaram nessa situação, para os quais a solução é demiti-los.
Estão espalhados por serviços dos ministérios mas também muitos nos municípios, que já deviam ter iniciado por sua iniciativa própria a remodelação indispensável, aproveitando as oportunidades que existem, tanto na agricultura como no turismo e outras atividades, aliás muitas delas dependentes de decisões dos próprios municípios.
Além de muitos outros em empresas e fundações públicas que usufruem de condições excepcionais mas que não contribuem de forma a corresponder pelo serviço prestado ao que recebem.
Quanto aos pensionistas também existem entre eles, os que recebem pensões para as quais não contribuíram, e que parecem ser as mais elevadas, devendo pois serem devidamente reduzidos às dimensões equivalentes às normais.
Conclusão:
Pior que as PPP só mesmo os PPP, até porque são eles que as fizeram e ainda não corrigiram os erros que praticaram e nos conduziram à situação atual.
Lisboa, 15 de Dezembro de 2011
Publicado no DN em 28 de Dezembro de 2011
Em 16 de Novembro passado apresentei no Colóquio dos Olivais uma comunicação com este título que será publicada oportunamente pela entidade organizadora, mas dada a situação que vivemos julgo ter interesse em apresentar já este excerto desse trabalho em que são indicadas algumas iniciativas a serem realizadas quase totalmente por entidades privadas e que permitirão a criação de alguns milhares de postos de trabalho, com a vantagem adicional de várias destas atividades terem características exportadoras, obviamente via o turismo de qualidade em que se inserem.
Será muito oportuno que os Ministros da Economia e do Ambiente tomem esta iniciativa
………”A lista das atividades marítimas passíveis de constituírem meios de aumentar a riqueza nacional é muito longa e neste momento interessa sobretudo aproveitar as de mais rápido retorno enquanto se preparam as bases para, a seguir, aproveitar as outras, se entretanto nos prepararmos, o que só será possível se a nossa população estiver integrada nas atividades marítimas e não, como está agora de costas para o mar, porque, mesmo que queira, não tem acesso ao seu usufruto.
Se houver da parte do Governo Central e dos Autarcas dos municípios com esses potenciais o entendimento desta realidade e das decisões que é indispensável tomar rapidamente.
3º Concretizando:
Vou apresentar-vos, como exemplos concretos, uma lista de empreendimentos possíveis de realizar, com fortes ligações ao turismo de máximo valor acrescentado, quase todos para investidores privados e os que não o são no início por razões operacionais, deverão posteriormente ser privatizados ou em certos casos especiais ficarem parcialmente municipalizados.
Tendo em atenção , que do ponto de vista ambiental, todos os exemplos indicados se pressupõe terem qualidade ambiental do mais elevado nível, o que aliás também é essencial para o seu sucesso económico pois, como têm ligação ao turismo só interessam empreendimentos de 5 ou 6 estrelas.
Bem basta o que se passa com a Ria Formosa que continua a ser gerida deficientemente, portanto com baixo nível de qualidade ambiental e consequente baixo nível económico e social.
1-Fecho da Golada na zona do Bugio, com aproveitamento de cerca de 120 ha sobre o cachopo sul, aproveitando para proteger definitivamente a Caparica e a margem direita do Tejo até Paço de Arcos e para melhorar o acesso do canal da barra
2-A construção de uma ilha no cachopo norte, na barra do Tejo, para um empreendimento de 5 ou 6 estrelas, aproveitado para melhorar o canal da barra e proteger a praia de Carcavelos
3-Desenvolvimento do Barreiro como o maior centro náutico do país
4-Dinamização do estuário do Tejo, em particular o Mar da Palha, para a pesca profissional e desportiva, e para a náutica ligada ao turismo e à educação
5-Marina de Castro Marim com cerca de 2000 postos de amarração, em que parte será para utilização dos munícipes e outra para “resort” de nível 5-6 estrelas
6-Marina em Vila Real de Santo António, na foz do Guadiana, com cerca de 2000 postos de amarração sem imobiliário pois o objetivo é complementar o imobiliário existente em Monte Gordo, que sofre o efeito da elevada taxa de sazonalidade por falta de um equipamento deste tipo e desta dimensão
7- Portos de recreio em Tavira, situados em Cabanas, Santa Luzia, 4 Águas e centro num total superior a 2000 postos de amarração
7-Porto de recreio “off shore” em frente de Vale do Lobo e da Quinta do Lago que sendo empreendimentos de elevado nível têm no entanto a falta deste equipamento para atingirem o grau mais alto da excelência, além do efeito protetor da costa que causa danos e preocupações todos os invernos.
8-Ainda se poderão considerar mais oportunidades, mas não tenho os mesmos pormenores, como seja em Olhão, onde já foi iniciado pelo município este desenvolvimento, bem como o rio Arade, o estuário do Sado, a ria de Aveiro etc.
Estes empreendimentos permitirão a criação de alguns milhares de postos de trabalho diretos e permanentes, quer nas atividades próprias quer nas atividades induzidas, além dos implicados na construção cujo setor atravessa uma situação muito díficil neste momento.
Além dos efeitos na economia e na participação da população nas atividades marítimas, também há a considerar o efeito psicológico porque se trata de uma abertura de novas oportunidades e não de fechos ou cortes, pois embora sendo estes necessários é essencial haver a contrapartida de factos futuros positivos.
Lisboa, 16 de Novembro de 2011
A indigitação recentemente verificada de gestores, aparentemente sem currículo político mas excelente currículo profissional, para cargos políticos da maior importância levantou um coro de comentários, porque parece haver dúvidas quanto à eficiência de um gestor de origem empresarial ou semelhante no desempenho de tais funções políticas.
O contrário, isto é a passagem dum cargo político para um empresarial já não levanta tais dúvidas mas, se por vezes isso acontece de forma a originar notícias nos jornais, normalmente apenas houve influência de decisões tomadas pelo visado no primeiro cargo que teriam favorecido alguns interesses da empresa para onde transitou, não se pondo a questão da eficiência.
O que interessa na resposta à questão posta em título deste escrito é esclarecer o que de facto influencia a eficiência da gestão por quem ocupa os lugares cimeiros de qualquer organização, seja ela uma empresa ou um país.
A definição mais simples de gestão eficiente a enunciar é: o conjunto de princípios e procedimentos que maximizem os resultados a atingir utilizando uma equipa competente e todos os meios ao seu dispor no mercado em que a entidade a gerir está inserida.
Estes princípios essenciais da eficiência são os seguintes:
1º-Distinguir o fundamental do acessório
2º-O primeiro fator é o pessoal,( as pessoas de dentro e de fora)
3º-Haver sempre responsáveis
4º-Tomar decisões efetivas e oportunas
5º-Basear-se nos pontos fortes e não nos fracos
6º-Libertar-se de preconceitos e ideias feitas
7º-Apontar para os resultados mais do que para o trabalho
Estes princípios adicionados às capacidades humanas e técnicas e à experiência em lugares de chefia e/ou ao treino em gestão como é normal nos cursos específicos devem ficar em equilíbrio com as características do cargo, a que se chama a posição estratégica, e que são: dependência hierárquica, poderes de decisão e informação recebida. A esta relação dá-se o nome de competência.
O primeiro fator de sucesso é a qualidade de liderança do responsável por essa equipa, e portanto pela sua competência, e a responsabilidade da sua escolha pertence a quem detém o poder de o indigitar. Se for uma empresa será a Assembleia Geral, ou seja os sócios que têm a maioria do capital, se for um país será o partido, ou a coligação de partidos que obtiver a maioria em eleições a isso destinadas.
A escolha dos candidatos a estes cargos obedece a critérios vários, alguns subjetivos e outros objetivos, entre ao quais as qualidades pessoais dos candidatos, entre elas as provas dadas anteriormente como sejam: os resultados obtidos, a capacidade de trabalho, a capacidade de liderar, a empatia e outras características pessoais e finalmente as capacidades técnicas mínimas para poder liderar toda a equipa, que se nas empresas já abrange vasta área, num país abrange todas a áreas de conhecimentos e de atividades.
Mas, perdoem-me a insistência, o mais importante é o seu comportamento ser orientado pelos princípios acima indicados.
A maioria, para não dizer todos, dos desvios verificados no nosso país que o conduziram à situação atual foram consequência do atropelo frequente de alguns ou até de todos eles.
Já Camões dizia”um fraco rei faz fraca a forte gente” e Damião de Góis “mais vale um exército de ovelhas comandado por um leão que um exército de leões comandado por uma ovelha”.
Por outro lado a atividade de gestão começa com a definição de objetivos e dos meios para os atingir cujo plano de ação faz parte das condições postas à partida quando da indigitação.
No caso de um país deverá ser definido durante o período eleitoral, aliás como acontece nas empresas, o que implica ter que haver depois um órgão que permita controlar a evolução durante todo o mandato de forma a evitar desvios, por ineficiência ou por fraude.
Tudo isto porque existe uma base democrática nestas relações de trabalho e de influências, pois em ditaduras nada disto acontece assim, e por isso mesmo se justificam nestes casos as demonstrações de protesto nas ruas, que em democracia significam a falta de eficiência das chefias dos partidos políticos que tem conduzido à enorme abstenção e á adoção generalizada dos movimentos de protesto popular, como única solução para a população se manifestar.
Porque se os partidos políticos fossem representativos de facto de toda a população o resultado das eleições bastaria para satisfazer a sua necessidade e interesse na solução dos problemas e em atingir os objetivos correspondentes às promessas eleitorais que ganharam as eleições.
Como melhorar esta situação que obviamente representa uma eficiência de governação fatalmente mais baixa do que seria desejável? E como controlar o trabalho de gestão dos eleitos?
Nas empresas privadas motivam-se os gestores (e seria excelente incluir também todos os colaboradores ) com ganhos proporcionais aos resultados obtidos e no estado deveria haver igualmente uma avaliação que premiasse (ou punisse) anualmente e no fim do mandato conforme os resultados atingidos.
Quanto ao controle, da mesma forma que nas empresas há o conselho fiscal, no estado já existe o tribunal de Contas que deveria ter essa função, talvez mais alargada e eleita sempre pelos partidos da oposição. Tal como o Provedor e qualquer órgão de controle, pois só assim nunca dependerão do poder a controlar, única forma de garantir a sua independência.
E como a Constituição não prevê este sistema só resta alterá-la em conformidade, mas por uma equipa onde haja alguém que tenha conhecimentos sólidos de gestão e não apenas juristas.
Conclusão final: em teoria não há razão alguma para preferir candidatos exteriores aos partidos, exceto se estes estiverem tão desacreditados, que já não conseguem apresentar candidatos aceitáveis.
Moral da história: para o sistema democrático ser capaz de gerar candidatos eficientes e portanto credíveis, os partidos têm que rever rapidamente as suas formas de gestão interna tal como as empresas e os países que quiserem sobreviver e progredir.
Lisboa, 24 de Novembro de 2011
Publicado no DN em 16 de Dezembro de
Todos os dias surgem à superfície do conhecimento público casos, por vezes de enormes dimensões, relacionados com a profunda e enraizada irresponsabilidade da vida deste País em geral e da vida política em particular.
Aquilo que o nosso Povo, submisso e acomodado, vai comentando com a convicção de termos brandos costumes e nada se corrige em tempo útil. Até vir alguém de fora para tentar por ordem na casa.
Na verdade é uma questão de cultura, não daquela que tem um Secretário de Estado a geri-la, mas da que significa a capacidade de dirigir o comportamento de um povo e que depende principalmente da qualidade das suas elites dominantes o que torna ainda mais difícil realizar rapidamente uma mudança sem cair em sistemas menos democráticos, como a História mostra vários exemplos.
Mas o que podemos e devemos fazer é analisar o atual sistema organizativo em exercício é melhorá-lo, a começar obviamente pela nossa Constituição, que algumas vozes proclamam ser perfeita, mas que na realidade enferma de defeitos muito influentes neste ambiente de enorme irresponsabilidade.
E para já vou focar apenas dois pontos a saber:
1º Aparentemente temos um sistema semi-presidencialista mas na verdade o que temos é um sistema bi-presidencialista pois o que acontece é elegermos diretamente um Presidente da República e indiretamente um Presidente do Conselho de Ministros que nomeia os deputados que o “elegem” donde resulta uma diminuição inaceitável da responsabilidade dos deputados e portanto da própria Assembleia.
Como se verifica diariamente no seu funcionamento.
2º Para que haja alguma hipótese de controle os órgãos controladores não podem ser dependentes dos órgãos executivos, tal como nas empresas, em que o Conselho Fiscal nunca é nomeado pelo Conselho de Administração.
Assim todos os órgãos controladores, como a Provedoria, o Tribunal de Contas, a Procuradoria Geral, etc., deveriam sempre ser nomeadas ou eleitas pelos partidos da oposição de forma a aumentar a garantia da sua independência e portanto da sua eficiência.
É evidente que isto só por si não chegará para acabar com muitas irresponsabilidades e compadrios mas já será um começo, sem o qual tão cedo poderemos começar a eliminar estes casos que tantos prejuízos causam ao País e que o colocam na situação deplorável em que se encontra, e pior do que isso, na herança de mediocridade que as atuais gerações estão a deixar aos seus herdeiros.
Lisboa, 23 de Setembro de 2011
Não foi publicado
Conferência realizada em 23 de Outubro de 2002 no Simpósio “O Serviço Público e o Mar”
1-O que significa o “Mar” quando se trata da sua relação com o poder nacional
2-O que é o poder nacional e que posição ocupa neste a Marinha.
3-Situação actual e perspectivas da sua evolução.
Em primeiro lugar quero agradecer ao nosso Almirante Fernando Melo Gomes o convite para estar aqui hoje colaborando convosco neste simpósio e a tratar de um tema que tenho perseguido desde o início da década de 70, diga-se de passagem com bastante tristeza, com assinalável insucesso.
Mas a esperança é a última a morrer e, por isso, nunca será demais continuar a tentar defender as actividades que fizeram Portugal ser o primeiro poder global marítimo, quando a opção seria não passar de uma província peninsular.
1- O Mar
Em conferência realizada na Academia de Marinha em 30 de Novembro de 1999 tive oportunidade de expor com alguma profundidade este tema e hoje vou ser mais sintético limitando-me a apresentar como dado adquirido e irrefutável que o Mar quando tratado no seio da estratégia nacional significa sempre olhar para ele como o meio onde se movem os navios, pois, de facto são estes os agentes concretos das actividades essenciais relacionadas com o Mar.
E não estou a desprezar as actividades artísticas para quem o Mar sempre foi grande inspirador.
Apenas estou a considerar o que é essencial em primeiro lugar.
Com efeito as primeiras grandes civilizações desenvolveram-se à volta de rios de grande dimensão: Tigre e Eufrates, Nilo, Yang-tsé.
Os navios, talvez mais propriamente as embarcações, então utilizadas eram de reduzidas dimensões e ainda com capacidades de carga e de resistência às ondas muito reduzidas, mas, mesmo assim, determinantes do desenvolvimento civilizacional que permitiu a essas populações atingirem a densidade populacional e as margens líquidas das suas actividades, indispensáveis para se transformarem em civilizações com influência decisiva na evolução da humanidade.
Algumas dessas embarcações apenas aproveitavam o próprio movimento dos rios pois não tinham ainda capacidade de deslocação autónoma havendo casos em que chegados ao seu destino eram desmontadas e parcialmente transportadas para montante as partes essenciais do revestimento do casco sendo as madeiras utilizadas na estrutura vendidas como matéria prima importante que era.
E se todas elas se situaram à volta de grandes rios foi sem sombra de dúvida porque estes constituíram a base essencial de via de transporte que permitiu a interligação entre populações numerosas que assim conseguiram dinamizar as suas potencialidades socioculturais e económicas.
As actividades básicas destas embarcações eram o transporte de pessoas e de carga e praticar a guerra fosse ela de ataque ou de defesa. Talvez algumas vezes alguém com oportunidade para isso tenha navegado por simples prazer o que leva a crer ser muito provável ter então sido o primeiro navegador de recreio.
Desde tempos muito recuados que se tornou necessário por vezes distinguir os navios destinados ao comércio dos que se pretendia usar em operações militares embora também não haja dúvidas de que nestas quase sempre foi essencial a utilização conjunta de vários tipos de embarcações porque já então havia necessidades logísticas para as quais os navios melhor dotados para combate não eram os mais apropriados.
O segundo passo da evolução das civilizações correspondeu às navegações costeiras portanto com preferência natural para os mares interiores e equivalentes: Mediterrâneo, Báltico, China ,Pérsico.
Então os navios já são maiores, mais fortes e começam a desenvolver-se as técnicas de navegação.
A estrutura das actividades marítimas não parece sofrer durante este período mudanças profundas embora o âmbito das movimentações vá sempre crescendo quer em quantidade quer em amplitude.
As áreas de influência dos povos intervenientes nesta fase de desenvolvimento aumentam substancialmente : os fenícios e mais tarde os gregos viajam pelo Mediterrâneo e saem para o Atlântico, sempre em navegação costeira, até às costas do norte da Europa; mais tarde os romanos constróem navios de grande dimensão e cruzam as costas de toda a Europa transportando tudo o que é importante para dar forma à primeira fase da constituição da Europa moderna sem esquecer que foram eles que estabeleceram a primeira rede de estradas que também contribuiu para aquela formação embora uma parte importante tivesse desaparecido durante a idade média.
Navios, sempre navios, na base de todo o desenvolvimento e do poder nacional dos países na vanguarda da civilização.
Ao se aproximar o fim da Idade Média e se iniciar o movimento de expansão europeia observa-se enorme desenvolvimento marítimo quer no Mediterrâneo quer no Báltico e no Mar do Norte correspondendo sempre e uma vez mais a desenvolvimentos na construção naval e nas técnicas de navegação para o que muito contribuiu a transmissão dos conhecimentos e atitudes característicos da civilização grego romana que voltam através das invasões árabes e da actividade das comunidades judias .
Aqui surge Portugal em cena, graças à sua posição central referida a estes movimentos, à necessidade imperiosa de desenvolver ligações políticas e económicas com o norte da Europa que lhe permitissem consolidar e garantir a sua independência e a fixação das suas fronteiras terrestres recentemente adquiridas vis a vis o poder crescente do seu vizinho castelhano.
E ainda à existência na sua população de uma percentagem elevada de judeus na sua burguesia que foi essencial para estabelecer um alto nível de desenvolvimento científico e tecnológico aliado às ligações comerciais que foram os alicerces de toda a evolução das navegações portuguesas do século XV aliada à existência de numerosos portos ao longo da costa onde havia quase outras tantas comunidades de pescadores, marinheiros e construtores navais.
Ligações essas que contribuíram para desenvolver os conhecimentos e as tecnologias que culminaram na travessia e no conhecimento do Atlântico Norte que permitiu, primeiro a viagem de Colombo, que aparece agora como o primeiro navegador de alto mar graças à cooperação portuguesa destas últimas décadas , e a seguir o resultado do Tratado de Tordesilhas. Isto é, o conhecimento antecipado pelos portugueses do Atlântico que orientou a estratégia joanina de empurrar Castela para a América Central deixando livres para Portugal o caminho para a Índia e para o Brasil.
A expansão europeia encontrou assim em Portugal a ponta de lança necessária para se abalançar ao passo seguinte: a passagem da navegação de costeira para oceânica mais uma vez com o correspondente progresso na construção naval e nas técnicas de navegação.
O Mar significa pois, para efeitos estratégicos o conjunto de actividades que constituem os poderes marítimo e naval, e que na prática se deveria resumir numa só palavra: Marinha.
O poder marítimo por sua vez é constituído por um núcleo de negócios que inclui não só o negócio marítimo típico, que em inglês se diz “shipping”( trading e transporte) mas também as pescas e mais uma vasta série de actividades dependentes da utilização de navios que vai desde transportes especiais até fiscalização ( quer para o pequeno mercado nacional o que é muito curto, quer para o mercado internacional como faz ,por exemplo, a Dinamarca ), investigação científica e tecnológica diversa, apoios à navegação, salvamento e segurança em geral, combate à poluição,etc etc., e ainda todo um conjunto de actividades e negócios induzidos essenciais como sejam projectos e construção naval, tecnologia de materiais, reparação, demolição e inspecção de navios, ensino e gestão especializada, financiamentos, seguros, legais e jurídicas, etc. sem esquecer a náutica de recreio, actividade essencial para preparar a juventude para viver o mar em toda a sua plenitude, além de também criar oportunidades de varias indústrias e serviços.
Por outro lado o poder naval além dos navios, das bases navais e seus equipamentos complementares exige um sistema mínimo permanente e um sistema máximo potencial para utilização em momentos de crise, que não consentem atrasos nem esperas, de apoio logístico de navios, equipamentos e pessoal que só existem se houver poder marítimo que os possua, além de inúmeras especialidades tecnológicas relacionadas com as suas necessidades militares específicas.
E esta segurança não se coaduna com a moda exagerada e nova do “outsourcing” que sendo meio excelente para em certos casos reduzir custos e incrementar a eficiência é noutros casos um autêntico tiro nos próprios pés, pois cria dependências que invalidam a independência que se pretende garantir com o desenvolvimento dos vários poderes em geral e com o militar em particular.
Além disto o poder naval exige o dispêndio de verbas avultadas que só conseguirão ter cabimento orçamental se o PIB for elevado e se houver um poder marítimo suficientemente forte para justificar a canalização de meios para a Armada e criar um ambiente favorável na opinião pública, factor sempre a ter em conta em qualquer democracia.
E ainda há o factor humano que como se sabe é o mais importante para a eficiência de qualquer empresa em geral e para uma força armada em especial e que será de muito melhor qualidade se o universo de interessados for maior e mais motivado, como acontecerá inserida numa sociedade onde exista um poder marítimo forte, em relação ao que sucede quando tal poder não existe ou é muito fraco.
Sem esquecer por um lado a indispensabilidade para a capacidade do poder naval de um alto nível de apoio científico e tecnológico e por outro as sinergias resultantes da colaboração nestes campos entre as forças armadas e a sociedade civil, mesmo tendo em conta os problemas de segurança resultantes desta interligação.
O exemplo mais frisante do que foi afirmado é o dos Estados Unidos.
Antes de terminar esta primeira parte há um aspecto essencial que exige um comentário, até porque foi baseada numa interpretação dele que na década de 90 houve um esforço político para acabar com a Marinha Portuguesa e esse aspecto é o da sustentabilidade destas actividades.
Era um facto indesmentível que as empresas estatais da Marinha Mercante nacional davam prejuízo ou consumiam subsídios mas também não era menos verdade que o seu enquadramento legal e operacional era e é totalmente desajustado, havendo bastantes estudos que poderiam e deveriam ser utilizados se houvesse vontade política capaz de promover as mudanças que permitiriam reconquistar a competitividade . Em vez disso promoveram-se subsídios em quantidades apreciáveis para actividades não estruturantes e até parasitas motivando muita gente para trabalhos ligados a dinheiro fácil degradando o nível empresarial e laboral do país e empolando alguns dados estatísticos momentâneos e superficiais.
Primeira conclusão: o poder global , fosse quem fosse a exercê-lo ou em que época tivesse existido, sempre foi baseado no poder marítimo e no poder naval.
Segunda conclusão: no caso particular de Portugal o poder marítimo está na base da sua identidade e da sua independência.
2. Poder nacional
Comecemos por uma breve excursão à definição do poder em geral, depois à do poder nacional e por fim ao nosso tema concreto
O poder é um potencial de realização que só se manifesta se há alguém que o exerça. Esse potencial poderá aumentar ou diminuir conforme a eficiência daquele exercício e até desaparecer se se esgotarem as condições que o enquadravam anteriormente.
O que significa que o poder não é uma característica de um único agente isolado mas o resultado das interligações de todos os agentes envolvidos.
Que poderão ser de naturezas muito diversas, mas ao analisarmos preferencialmente o poder nacional vamos considerar apenas os níveis dos poderes nacionais ou equivalentes com os quais convivemos e com alguns dos quais competimos.
Ou deveríamos competir.
E é um potencial relativo aos outros poderes concorrentes pois o que conta é o diferencial existente entre ele e os outros. Se, por exemplo, houver dois países concorrentes ao domínio de uma região e um deles tiver dois navios e o outro nenhum, poderá aceitar-se ser uma frota de dois navios suficiente.
O poder implica pois e sempre uma ligação a alguém, seja uma pessoa singular ou colectiva e a luta pelo seu controle, ou mais simplesmente a luta pelo poder sempre foi uma das duas componentes essenciais da evolução da história. A outra é a luta pela sobrevivência tanto das pessoas individualmente como das entidades colectivas sejam elas povos ou empresas.
Para não nos afastarmos do nosso tema vamos limitar a nossa exposição ao poder nacional onde se inserem os poderes atrás enunciados.
Interessa aqui fazer um pequeno parênteses para recordar que a classificação dos poderes se faz desde de pontos de vista diferentes, isto é, de quem o exerce e do campo onde é exercido.
Assim poderíamos ter o poder de uma empresa ou de uma instituição, por exemplo de uma Armada ou de uma Força Aérea, ou do país e portanto um poder nacional muito mais lato e abrangente.
Acima do poder nacional estão os poderes combinados de países aliados e no topo o da ONU, sempre que esta organização consegue funcionar como tal.
Fiquemos por agora pelo poder nacional e deixemos as questões relativas ao poder pessoal para Maquiavel e outros autores que a estes aspectos se tem dedicado.
E do segundo ponto de vista poderíamos considerar, por exemplo, um poder exercido apenas no nosso território continental, portanto local, ou na região Ibero Africana portanto regional ou no mundo todo portanto global.
A história de Portugal mostra como o nosso país conseguiu atingir no final do século XV um poder nacional a nível global, essencialmente apoiado no poder marítimo e no poder naval, e que pesou fortemente não só na vida do país mas também na evolução da humanidade.
O poder nacional consta de vários poderes conjugados de forma complexa que a seguir se indicam por ordem aleatória, pois não se pretende, pelo menos por agora, privilegiar qualquer deles :
Como se sabe, e já aqui foi comentado, o poder só subsiste se for exercido, e só assim será se houver permanentemente uma estratégia para a sua aplicação.
A palavra estratégia começou por estar ligada essencialmente à actuação de uma força armada em confronto com forças inimigas.
Depois, como aconteceu com muitas outras palavras foi evoluindo, adquirindo, neste caso, um significado mais lato quer abrangendo outras forças para além das armadas quer considerando praticamente todos os campos da actividade humana.
De tal maneira se aplica a todas as actividades que a gestão, que está para a actividade como a filosofia para o conhecimento, já se não deve aplidar de estratégica sem cometer o pecado do pleonasmo, porque não pode haver gestão eficiente sem estratégia.
Vamos pois considerar como estratégia a análise conjugada das circunstâncias e dos meios existentes para atingir os objectivos pretendidos de forma a garantir o sucesso continuado e seguro.
Esta definição poderia levar-nos a considerações interessantes sobre os significados implícitos nos vários passos que a constituem. Mas seria um tanto fora do objectivo desta comunicação e por isso saltamos em frente.
O estabelecimento de uma estratégia passa sempre por três degraus tão simples de enunciar como difícil de conseguir cumprir:
1º-Quem somos e onde estamos.
2º-Quem queremos ser e para onde queremos ir.
3º-Como fazer.
O que desde logo pressupõe a determinação rigorosa do conteúdo da nossa vontade sem o que se torna muito problemática a definição daqueles objectivos e o conhecimento completo de todo o enquadramento em que se opera, de forma a identificar com rigor todas os condicionalismos favoráveis e desfavoráveis.
A determinação de quem são os inimigos e os amigos potenciais dependerá da conjunção daqueles condicionalismos com os nossos objectivos.
Pode pretender-se apenas sobreviver que é um objectivo, digamos modesto, mas essencial. E mesmo sendo modesto tem que se concretizar em que nível pretendemos fazê-lo, ou melhor com que nível queremos viver. Porque sobreviver é na verdade recomeçar a viver.
Queremos progredir?
Aumentar o nosso poder para , por exemplo, conseguir atingir melhor qualidade de vida?
Ou para ter mais probabilidades de êxito nas nossas estratégias de defesa?
Ou teremos ambições de crescimento territorial ou económico, o que implicaria estratégias ofensivas mais poderosas e arriscadas, como já tivemos nos tempos áureos de D.João II?
Todas as questões desta natureza devem ficar definidas quando se parte para a elaboração duma estratégia nacional.
Se assim não acontecer podem fazer-se os exercícios que se quiserem mas nunca se chegará a possuir uma verdadeira estratégia o que significa que se andará à deriva tal como um navio sem porto de destino.
A partir da década de 50 foi hábito a realização de planos com algumas pretensões estratégicas mas a que faltavam alguns factores essenciais para terem alguma possibilidade de êxito, em particular a determinação correcta de objectivos e a vontade dos responsáveis máximos, sem o que, qualquer plano estratégico não é mais que folhas de papel que deram enorme trabalho a equipas especializadas, para serem arquivadas algures.
Antes de ir mais além convém esclarecer um ponto essencial: a estratégia é um meio ao dispor de quem tem responsabilidades de gestão sejam elas políticas, empresariais ou pessoais. O que é comum a todas as estratégias é a metodologia não o conteúdo do conjunto de informações que elas implicam nem as características de quem as aplica, i.e. o estratego respectivo.
Por outro lado a aplicação de uma estratégia pode ter êxito não tanto pelo seu mérito mas por outras razões das quais a mais corrente é a das circunstâncias favoráveis, o que significa que o valor de uma estratégia é particularmente relevante sempre que os meios ao dispor do estratego são escassos e as circunstâncias envolventes são difíceis ou pouco favoráveis.
Sem esquecer que a actuação do estratego não se pode confinar à análise e ao planeamento mas é essencial na fase da realização onde se torna vital juntar ao rigor da execução e à firmeza da vontade a força da capacidade de adaptação às mudanças que se operam no exterior e no próprio interior que sempre evolui, até como consequência das mudanças em curso para realizar a estratégia pretendida.
Temos exemplos de sobra de factos passados durante a nossa história que ilustram esta verdade.
Vejamos agora o que se passa quanto ao âmbito da estratégia
Quando se trata de uma pessoa será uma estratégia pessoal.
Conforme se for subindo na escala de grandeza teremos estratégias familiares, empresariais, bairristas, municipais, regionais, nacionais, regionais mais alargadas, e finalmente mundiais.
Vamos agora referir apenas a nacional por ser aquela que mais se relaciona com o poder marítimo e é a base das seguintes.
Os campos de actuação de uma estratégia nacional são quatro:
a evolução prevista da vida global com utilização de cenários ,
o exterior adverso (preferível ao termo inimigo, algo redutor),
o exterior favorável,
a estrutura interna.
O facto de se apresentarem estes quatro campos de actuação resulta da necessidade de dividir para analisar embora muitas vezes se verifiquem inúmeras interligações e se esbatam as respectivas fronteiras.
Com efeito a evolução global tem uma componente cósmica onde pouca ou nenhuma influência temos.
No entanto já temos agora algumas capacidades que não existiam há alguns anos atrás: é, por exemplo, o caso dos meteoritos de dimensão perigosa que eventualmente possam vir a cruzar-se com a Terra.
Já poderá haver recursos para os destruir ou desviar o que implica uma estratégia defensiva decisiva para o futuro e com enormes repercussões na vida dos países qualquer que seja o seu grau de êxito.
No caso da meteorologia, até há poucos anos considerada uma variável incontrolável pelo homem,
há agora a consciência de que passou a ser em grande parte uma responsabilidade humana.
Desde há vários séculos que se conheciam os efeitos da acção do homem sobre a natureza mas sempre em zonas restritas: desvios de rios, desmatamentos de grandes áreas, construção de cidades, etc.
Agora sabemos que, em grande parte, demasiada para o estado atrasado das relações humanas a nível mundial, a natureza está fortemente condicionada pela actividade humana em particular a biosfera que é exactamente o sustentáculo único da vida humana pois é dela que depende a existência do ar que respiramos, da água que bebemos e da comida que comemos.
Também sabemos que só se consegue alguma probabilidade de haver paz entre os homens se estes não estiverem enquadrados por situações extremas nos limiares da sobrevivência em que se sabe ser fatal recorrer à violência e ao extermínio como meio de tentar sobreviver.
Quanto aos meios a utilizar temos a considerar: a logística onde os transportes tem um peso enorme, a economia e a finança, a informação, a diplomacia, e naturalmente as forças militares terrestres, navais e aéreas, sem esquecer as espaciais e as nucleares.
Quando se diz a utilizar quer-se dizer utilizáveis por qualquer dos lados em confronto.
A definição do prazo: nem tão curto que não chegue sequer para se distinguir de um simples movimento nem tão longo que se torne ficção científica, mas tendo em consideração que o prazo mínimo indispensável para desenvolver qualquer tecnologia ou para formar uma geração ronda entre os dez e os vinte anos.
As componentes da estratégia: as técnicas de programação e de decisão, a consciência do que se é e a vontade do que se quer ser, e finalmente a visão que se tem do futuro.
O futuro é a resultante da evolução da vida em geral e da nossa vontade, entendendo-se nesta nossa vontade duas parcelas: uma que depende directamente de nós e outra onde nós participamos e somos apenas uma pequena parte mas que no entanto podemos influenciar mais ou menos conforme a nossa força e a nossa convicção.
Uma coisa podemos ter como certa: tudo o que fazemos ou deixamos de fazer contribui para o futuro. Para o nosso certamente em maior grau, muitas vezes a 100%, mas também para o geral seja em que grau for.
Tudo isto sem esquecer que uma estratégia nacional não pode ser tratada como duma batalha se tratasse: nesta sabe-se quem é o inimigo, naquela enumeram-se ameaças hipotéticas e exigências concretas, nesta o tempo é agora, naquela o tempo é sempre.
Porque a estratégia nacional é uma ferramenta do poder nacional e este avalia-se como as árvores: pelos seus frutos.
Por outro lado temos que insistir em que a estratégia é um meio essencial de exercer o poder com eficiência mas implica a existência real desse poder. Doutro modo, isto é, se não houver manifestações concretas daquele exercício a estratégia passa a figurar como actividade intelectual do tipo de jogo de xadrez mas com o inconveniente em relação a este de não haver jogos para se aferir da sua validade sem perigos graves para o país.
A história de Portugal mostra que a falta de eficiência no tratamento do poder pelas elites dominantes verificada desde o século XVI teve como consequência a diminuição progressiva do poder nacional até ao estado actual.
E este nosso poder nacional sempre esteve intimamente ligado aos poderes naval e marítimo.
Conclusão final: o Mar e o seu potencial ainda hoje continuam à nossa disposição como peça essencial para sermos novamente um País central e forte em lugar de sermos periféricos e fracos.
3- Situação actual e perspectivas de evolução
Vimos atrás que não é possível ter poder naval sem ter poder marítimo.
A nossa Marinha Mercante actual é apenas um resíduo e as outras actividades económicas ligadas ao
Mar dão contribuições para o PIB nacional extremamente diminutas e muito inferiores ao que deveriam e poderiam ser . As palavras de Oliveira Martins no seu “Portugal e o Mar” continuam a ter hoje uma tremenda actualidade o que não abona nada a favor das entidades actualmente responsáveis por estes assuntos.
As elites dominantes portuguesas continuam a usar critérios de avaliação e decisão desviadas das nossas realidades e dominadas pelo imediatismo eleitoral, pelo mediatismo e pelos critérios tecnocráticos e economicistas das atribuições de subsídios que repetem agora os malefícios originados pelos dinheiros fáceis que não dependem da produção e da venda mas muito mais dos arranjos burocráticos das estruturas estatais que assim crescem sem qualquer contrapartida útil com futuro, como aliás já aconteceu mais que uma vez durante a nossa história.
Por mediatismo entende-se o fenómeno que leva a uma sociedade só dar importância ao que aparece nos media ( com grande relevo para a TV ) e como as entidades que operam esses media obedecem prioritariamente a critérios lucrativos isso significa que contribuem muito pouco para corrigir situações como esta do desinteresse generalizado pelo mar e pela Marinha porque elas não atraem as audiências que lhes paga a publicidade.
Além disto os componentes dos nossos órgãos de soberania mostram grandes preocupações pelos assuntos financeiros habitualmente com grandes atrasos, do que resultam frequentes crises, mas mesmo os mais rigorosos esquecem sistematicamente que os problemas mais graves de Portugal não são os financeiros mas os estruturais, que vão dos próprios princípios até aos procedimentos mais correntes, até porque aqueles, os financeiros, são causados por estes e não o contrário.
Daqui ser muito preocupante ver as desejadas medidas correctivas da vida nacional serem iniciadas pelo sector financeiro sem o devido acompanhamento de medidas estruturais como seja no restabelecimento do serviço militar, no fomento ao trabalho manual e técnico, na melhoria dos procedimentos jurídicos e administrativos do serviços centrais e autárquicos de forma a não permitir e incentivar a criação de dificuldades para depois se venderem soluções personalizadas e muitos mais atritos e parasitismos que minam a estrutura moral e comprometem a competitividade nacional.
E se entretanto algo se vai fazendo a lentidão continua a ser preocupante pois há muitas coisas simples que se podem fazer de imediato, como por exemplo dar bons exemplos e eliminar tolices como a tolerância zero.
Não podemos esquecer que durante as últimas décadas temos tentado resolver as questões fundamentais do País pelo processo da aplicação de soluções imediatas, simplistas e populistas caracterizadas por dinheiros fáceis, que neste caso foram os subsídios comunitários, criando muitas actividades parasitas sem qualquer sustentabilidade a médio prazo, e agravando ainda mais a situação pela manipulação das estatísticas para contentar a população com promoções sociais artificiais e inconsistentes.
Em vez de melhorar o ensino aumentando as motivações dos estudantes e exigindo melhores resultados optou-se por baixar o nível das exigências originando gerações sucessivas de estudantes desmotivados e mal preparados para trabalhar a quem acenam com diplomas de licenciaturas sem aplicação prática e desvalorizando o sentido mais profundo do trabalho produtivo como componente essencial não só da economia mas mais do que isso do equilíbrio moral e social do país.
Surgem agora sinais de mudança nesta matéria. Esperemos que ganhem aceleração e sejam acompanhados pelas motivações desejáveis a serem dadas pelo Estado , pelo empresariado e pelos sindicatos.
Têm também vindo a verificar-se numerosos equívocos de finalidade com sejam, por exemplo os livros escolares que devendo ser para os alunos parecem ser mais para os editores, a construção civil que devendo ser para os cidadãos parece ser mais para os construtores e para os políticos, as farmácias que devendo ser para os clientes parecem ser mais para os farmacêuticos, as escolas que devendo ser para os alunos parecem ser mais para quem nelas trabalha, as universidades que devendo ser para produzir conhecimento parecem ser mais para fabricar diplomas à custa de muitos alunos que pouco aprendem que lhes seja útil, os serviços do Estado e das Autarquias que devendo ser para resolver problemas aos cidadãos mais parecem existir para lhes criar dificuldades, os Órgãos de Soberania que devendo existir para servir o País mais parecem tantas vezes servir preferencialmente os interesses próprios ou dos partidos.
Como consequência de tudo isto, somado o mau hábito ganho durante as gerações anteriores de não haver protagonismo na vida nacional por parte da maioria da população, verifica-se a maior indiferença pela actividade de cidadania deixando unicamente aos partidos políticos a função de a representar .
Por outro lado ainda o egocentrismo ancestral e a mesquinhez que resultam de todos estes factores
traduz-se em baixa competitividade, em qualidade de vida medíocre, em enorme poluição urbana, em suma na diminuição da nossa capacidade de enfrentar com sucesso os imensos desafios que a conjuntura internacional e a própria evolução natural que dia a dia vão surgindo.
Assim se chegou à situação actual de os próprios empresários só encontrarem soluções para os seus problemas de produtividade no aumento da imigração que lhes traga mão de obra barata, pois não são capazes de melhorarem os procedimentos de forma a conseguirem ser competitivos por essa via. E por outro lado os procedimentos do Estado ainda sob a velha influência do condicionamento industrial continuam a dificultar em vez de incentivar o progresso tecnológico.
Assistimos assim há pouco mais de dez anos à destruição da marinha mercante portuguesa sem se ter tentado sequer ensaiar uma solução que motivasse o capital industrial português a investir nesta actividade. É um facto que era indispensável uma revisão quase total do enquadramento, muito do qual ainda sofre influências do século XIX, mas esse trabalho já foi há bastante tempo realizado e entregue a quem de direito mas nada aconteceu.
Aliás nas pescas as reformas estruturais que foram tentadas no início dos anos 80 e rejeitadas pelo executivo desse tempo não possibilitaram a adaptação que então se previu ser necessária para quando estivéssemos incorporados na comunidade europeia e assim chegamos á situação actual de dependência e baixa produtividade.
Na náutica de recreio o atraso no estabelecimento de postos de atracação e das restantes facilidades inerentes tem dificultado e atrasado o desenvolvimento das indústrias respectivas com o habitual crescimento dos importadores tanto do agrado dos nosso poderes instituídos mas com consequências funestas para a nossa saúde financeira.
A componente económica do poder marítimo foi, e ainda é, essencial para a manutenção da nossa independência para além do seu valor económico porque faz parte da própria estrutura que caracterizava o ser português.
Também interessa recordar que todo e qualquer programa de defesa nacional eficaz tem que integrar toda a população num ideal nacional consistente, concreto e coeso e esse elo foi nos tempos da consolidação da nacionalidade a actividade marítima.
Só que estas características não se mantém inalteradas ao longo do tempo. Sempre foram evoluindo umas vezes mais rapidamente outras vezes mais lentamente e em direcções variáveis conforme as influências do meio e os comportamentos das elites dominantes.
Admitindo que pode haver elites diferentes a que correspondem comportamentos completamente diversos e portanto com influências por vezes até opostas na identidade resultante para a população em geral. Como aconteceu em Portugal nos séculos XV e XVI.
Porque os comportamentos das massas populacionais são fortemente influenciados pelos comportamentos das elites que as enquadram quer como consequência de poderem ser chefiadas por elas quer pelo exemplo por elas dado. O que significa a possibilidade de haver influências importantes por parte de elites não dominantes politicamente mas com peso a nível religioso, cultural ou laboral.
Neste momento em que se processam desejáveis e indispensáveis reformas nos sectores orçamentais e fiscais ainda é mais importante que se proceda imediatamente a reformas estruturais nos princípios essenciais e nos procedimentos dos serviços do Estado para os cidadãos que, em conjunto com os exemplos dados pelos Órgãos de soberania e autarquias, constituem o enquadramento fundamental da verdadeira Educação Nacional.
Para Portugal, como qualquer outro país, ser independente implica ter poder nacional.
Para Portugal o poder nacional sempre foi assente no Mar, isto é, na Marinha.
Quando esta enfraquece, como agora se verifica, Portugal torna-se um país periférico com fraco poder nacional.
Se desaparecer, como agora está em vias de acontecer se nada se fizer para contrariar tal tendência, o próprio país seguir-lhe-á esses passos.
E que se não diga que é por termos inimigos, porque quem tem elites assim, i.e. se elas não fizerem o que é possível e correcto, nem precisa de os ter.
Para finalizar peço-vos que sempre tenhamos presente que grande parte do nosso futuro depende de nós.
E para ele ser melhor é forçoso corrigirmos os desvios apontados e ... trabalhar muito e bem, já.
Base Naval de Lisboa - Alfeite
23 de Outubro de 2002
No seguimento do artigo denominado “Portugal e a Cultura do Mar” julgo ser oportuno recordar a parte de uma comunicação apresentada no Barreiro durante uma sessão ali realizada pela Academia de Marinha, em 1997, que mais interessa a este assunto e que mostra claramente o imobilismo, pelo menos, daqueles a quem competia e compete criar as condições essenciais para o desenvolvimento sustentado das populações, neste caso do Barreiro, e que era uma antevisão de uma visita aqui realizada em 2007.
“A primeira grande conquista no que respeita a actividades marítimas do Barreiro foi o aproveitamento da margem direita do rio Coina para aí instalar uma marina de largas proporções utilizando intensamente na sua concepção estruturas flutuantes que permitiram reduzir custos e impactos ambientais e criar mais de três mil postos de atracação para embarcações de recreio de dimensões diversas desde as mais pequenas, digamos da ordem dos 5m de comprimento, até às de porte mais elevado o que significa cerca de 30m, ou mesmo mais.
Associados à marina, como é normal, surgiram programadamente duas escolas de vela ligadas a outros tantos clubes náuticos locais, oficinas de reparação e fabrico de velas alem do grande desenvolvimento da já existente, oficinas de reparação e de manutenção de motores e embarcações, e todo o equipamento indispensável à assistência a embarcações com meios de elevação e deslocação permitindo também em zona mais afastada a armazenagem em terra de embarcações para hibernação.
Na zona da marina verifica-se a existência habitual de restaurantes dos mais variados tipos e classes possibilitando uma oferta muito variada não só aos navegadores como aos numerosos visitantes que sempre acorrem a estes locais, bem como muitas lojas também características deste tipo de clientela.
Dada a afluência de viaturas foram construídos vários parques de estacionamento alguns deles aproveitando diferenças de nível dos terrenos circundantes para atingir maiores capacidades sem os inconvenientes da ocupação de espaços que merecem utilização mais nobre e mais proveitosa.
Não foram também esquecidas as indispensáveis instalações de serviços de socorros e clínicos, aliás colocadas em local estratégico do ponto de vista de fácil acesso, bem como balneários e instalações sanitárias.
Ainda na área de influência directa da marina foram construídos dois hotéis de porte médio ( 250 a 300 quartos) e um centro comercial , sendo de notar a solução encontrada para instalar o edificio da gestão da marina e das autoridades marítimas que foi a de utilizar uma plataforma flutuante situada estrategicamente à entrada, isto é, perto da embocadura do rio Coina e ligada a terra por uma passagem flutuante.
Embora não houvesse ocasião para visitar ficámos a conhecer a existência de várias unidades de animação para crianças e para adultos todas elas relacionadas com o mar utilizando técnicas modernas que tem enorme poder de atracção sendo simultaneamente educativas.
Para enquadrar tudo isto foram criadas muitas zonas verdes e caminhos pedonais evitando a poluição atmosférica e visual causada pela ocupação por viaturas das zonas nobres.
Indo agora para o centro da cidade visitamos o Instituto de Estudos Gâmicos instalado no Convento da Verderena onde se pode apreciar o que de melhor se faz em modelismo náutico e tomar conhecimento do que se tem realizado no campo da formação, do controlo de qualidade e do estudo do próprio projecto dos modelos, além do museu onde se podem observar exemplares excelentes desta actividade.
Ainda ligados a esta instituição também se pode tomar conhecimento de diversos trabalhos de investigação nos campos da arqueologia naval e do projecto de novas embarcações de vela.
Mais adiante na margem norte junto ao rio pode ver-se o novo “eolodromo” com bancadas para 5 000 espectadores, equipado com sistema de ventiladores que permite realizar treinos e provas de prancha à vela e pequenas embarcações e que se tornou num chamariz de visitantes durante todo o ano dado o clima permitir a sua utilização permanente.
No centro da cidade visitámos também uma galeria de pintura especializada no tema de marinha que se tornou no centro mais importante desta actividade no nosso país e já é conhecido no estrangeiro estando ligado a várias organizações internacionais de pintura de marinha.
Relativamente perto do terminal fluvial está uma réplica da nau S. Gabriel que não tendo sido possível estar pronta em 1997 para ir à India se conseguiu entretanto construir, com custos muito inferiores uma vez que aqui ficou como museu, e onde se pode ver como estava equipado este navio e como vivia a bordo Alvaro Velho e a tripulação comandada por Vasco da Gama.
Mais a montante no rio Coina, pouco afastado da capela de Sto. André, entretanto recuperada, está o estaleiro da Azinheira Velha reconstituído de forma a mostrar como era um estaleiro dos fins do século XV onde a nau S. Gabriel foi construída.
Também nesta zona da cidade pudemos visitar o museu da muleta onde estão expostos modelos desta e doutras embarcações típicas deste local e artes de pesca aqui utilizadas em tempos idos e algumas ainda hoje, e mais adiante o museu do bacalhau e da pesca longínqua que como se sabe teve aqui um pólo importante e ainda hoje funciona.
No lado nascente da cidade observámos o cais de carga reactivado com movimento de contentores e granéis transportados em navios de cabotagem europeia, muitos já em bandeira portuguesa depois das alterações entretanto regulamentadas pelo governo português que permitiram a existência de armadores nacionais competitivos assim conseguindo reduzir drasticamente os custos e a poluição dos transportes de mercadorias de e para esta região.
Ainda na zona dos moinhos de maré um dos quais completamente reconstruído e em que uma das caldeiras foi adaptada a actividades lúdicas apreciámos a torre de Alvaro Velho no topo da qual almoçámos enquanto disfrutávamos da magnífica vista do mar da Palha, de parte da península de Setúbal e de Lisboa que se tem dos seus cento e muitos metros de altura.
Junto da torre foi construído un conjunto de casas, réplicas de construções do século XV, onde existem restaurantes, lojas e outros pontos de animação afins, dentro da filosofia de recriar um ambiente renascentista, português e animado.
E conforme nos foi esclarecido pelo nosso cicerone tudo o que vimos foi, ou ainda, está a ser pago pelas suas próprias receitas.
A falácia de que só é possível o desenvolvimento se houver subsídios foi aqui desmentida, desde que o binómio administração pública/iniativa privada funcione eficientemente.
Muito ficou ainda por ver, mas mais não foi possível apreciar num simples e único dia de Julho de 2007.
Enquanto nos deslocámos de local para local pudemos notar como melhorou o panorama arquitetónico da cidade, os jardins que entretanto se construiram e a influência que houve em toda a população que de facto compreendeu a importância das actividades marítimas na sua própria vida não apenas profissional mas também particular.
Os valores dos indicadores económicos e sociais que resultaram destas transformações não quero enfatizá-los para não parecer demasiado politizado embora eu seja totalmente independente, mas é patente ( estou a falar em 2007 ) a subida de nível de vida e de participação activa da população nesta cidade nos últimos dez anos como consequência de haver esta intensidade de actividades marítimas.”
Como tudo isto se pode fazer, quanto é preciso investir e tudo o mais não é assunto para vos maçar no fim de um dia cheio como o de hoje.
Fique-se no entanto com a ideia que toda esta ficção pode ser verdade.
Barreiro, 5 de Julho de 1997”
Publicado na Revista de Marinha em Julho de 2011
Foi noticiado há dias o aumento do preço dos transportes.
No que se refere aos transportes colectivos em Lisboa esta notícia merece alguns comentários porque de facto a sua eficiência é baixa em grande parte por causas de certa forma exteriores à gestão das empresas que prestam estes serviços.
Com efeito os autocarros não podem deslocar-se a velocidades médias mais altas porque as ruas por onde circulam estão frequentemente estranguladas por veículos mal estacionados e ainda mais por muitos veículos que circulam muitas vezes ocupados apenas por uma pessoa.
Esta situação poderia ser resolvida se for organizado um sistema constituído por parques de estacionamento em locais estrategicamente colocados fora da cidade de forma aos condutores aí deixarem os seus carros, deslocando-se para os seus destinos em autocarros ou comboio devidamente conjugados com o metropolitano e transportes fluviais.
Nos finais da década de 80 uma entidade denominada Federação Portuguesa de Transportes enviou aos vários Ministros que interferem nos transportes e a todas a Câmaras Municipais da área metropolitana de Lisboa uma sugestão para se organizar este sistema e assim, não só melhorar a eficiência da rede de transportes colectivos mas também diminuir o consumo de combustíveis e a poluição e aumentar o nível da qualidade de vida dos lisboetas, retirando alguns milhares de carros do centro da cidade.
Para isso ser possível haveria dois períodos por dia, no início da manhã e no fim da tarde, em que nas vias essenciais de acesso não poderiam circular carros particulares, respectivamente nas entradas e nas saídas.
Também teria que haver uma rede conjugada de linhas de deslocação com todos os meios incluídos, não esquecendo o importantíssimo meio que é o peão, aliás totalmente esquecido pelos decisores de serviço, de modo a que se maximize a capacidade de cada cidadão chegar ao seu destino em menos tempo e por menos gasto de dinheiro, simultaneamente poupando investimentos e consumos.
Só um dos Ministros respondeu e das Câmaras nem uma palavra.
Agora que estamos declaradamente em crise será obviamente oportuno levantar esta questão pois em vez da fatalidade do aumento do preço dos transportes sempre será desejável, porque não há maneira de ser obrigatório, realizar um acto de gestão correcto.
Lisboa,21 de Dezembro de 2010
Publicado no DN em 8 de Janeiro de 2011
Ao elaborar este texto tive dois objectivos essenciais: o primeiro dar uma ideia das circunstâncias relacionadas com os transportes que estiveram da criação desta Secção da Sociedade de geografia de Lisboa e o segundo enfatizar a importância da Comunicação Social para a sociedade civil poder exercer a sua contribuição para democraticamente influenciar a vida do país no sentido do desenvolvimento e da sustentabilidade, tal como me foi reforçado durante a convivência com o Dr. Bettencourt Resendes.
Assim começo por uma curta introdução à essência dos transportes.
As movimentações das mercadorias e das pessoas têm para a vida humana, papel idêntico ao que tem o sangue no corpo humano: qualquer deficiência provoca quebras da saúde nos humanos e diminuição na competitividade numa população.
Só por esta razão, além de outras, os transportes, ou melhor, o sistema de transportes a utilizar tem que ser muito bem estruturado e gerido sem o que jamais se atingirá um nível de competitividade aceitável.
As pessoas movem-se a pé, em elevadores e escadas rolantes, em bicicletas e em viaturas individuais (que podem levar mais algumas), em viaturas de transporte colectivo, em comboios, em barcos (seja nos rios ou no mar), em aviões e helicópteros. Por sua vez as mercadorias podem ser transportadas por meios rodoviários, ferroviários, fluviais e marítimos e aeronáuticos.
A escolha dos meios a utilizar depende das distâncias, das dimensões, dos caudais e do tipo da mercadoria.
Uma coisa é certa, e tem que ser tomada em consideração: sempre que há uma mudança de meio a utilizar para se atingir o destino final, isso tem custos e incómodos que pesam quando se estabelece um sistema de transportes.
Outros condicionamentos essenciais são: o consumo energético e os impactos ambientais. No primeiro basta recordar que o mais económico é o que utiliza como meio de suporte a água, a seguir o ferroviário, depois o rodoviário e por último o aeronáutico.
E convém ainda recordar também que os custos optimizados implicam velocidades razoáveis mas quando estas são muito elevadas a subida dos custos só pode ser justificada se a quantidade transportada for suficientemente alta.
Todos estes condicionamentos somados à componente geográfica da distribuição das origens e destinos implicam a necessidade de um sistema de transportes estar intimamente ligado com o ordenamento territorial em geral e com o urbano em particular, pois todas as indústrias que manipulem grandes quantidades de matérias primas e produtos devem estar situadas em locais com acesso aos meios de transporte mais eficientes para não comprometerem a sua competitividade.
Após esta resumida introdução, que a realidade aconselhou a fazer, aqui inicio agora a análise dos últimos 25 anos, tentando não ser excessivamente negativo, apenas seguindo o princípio de que só se consegue melhorar quando se tem consciência dos erros cometidos. Na verdade só ver erros é doentio, mas não querer analizá-los é remata tolice.
Quando, entre 82 e 83 cheguei à Soponata, depois de oito anos de ausência desta actividade em Portugal, constatei o seguinte:
A competitividade desceu em parte importante por causa dos nossos transportes. Porque:
1º não tínhamos um sistema integrado de transportes, e continuamos a não o ter.
2ºdesde o período da revolução industrial não tivemos e continuávamos, e continuamos, a não ter uma conjugação minimamente efectiva entre os responsáveis pelos transportes e pelo ordenamento com especial relevo para o urbano, ficando-se com a sensação de que o critério principal tem sido a componente de optimização imediata do negócio imobiliário, o que onera a construção das infraestruturas dos transportes, reduz a sua eficiência e baixa a qualidade do serviço prestado.
Incluindo o mau funcionamento da rede ferroviária, o desprezo pelo transporte fluvial, a deficiente coordenação dos portos e das suas ligações aos hinterlandes potenciais respectivos e outros problemas deste tipo. Embora, apesar destas dificuldades, alguns portos têm progredido de forma assinalável, com excepção do de Lisboa que continua com várias indefinições e mau aproveitamento de iniciativas com grande potencial de desenvolvimento económico e social.
3ºDeficiente alocação dos investimentos e dos objectivos a atingir o que levava, e leva, a discutir assuntos com baixo interesse nacional relegando para segundo plano os assuntos essenciais para elevar a competitividade, exemplo: o TGV (designação infeliz porque se trata de uma marca francesa), que é mais importante para os espanhóis, que ambicionam ter todas as capitais das regiões ligadas a Madrid por comboios rápidos, mas para nós o que é de facto importante é termos uma rede em bitola europeia a trabalhar bem (isto é incluindo os indispensáveis centros logísticos), obviamente ligada a Espanha que é dos mais importantes clientes das nossas exportações e isto, é que de facto nos pode ajudar a criar postos de trabalho permanentes.
4ºenquadramento da actividade do transportador marítimo desajustado em quase todos os sectores da sua gestão: pessoal, registo, financeiro, jurídico, etc..
5ºdestruição da Marinha Mercante, logo nos anos a seguir, que aliás põe em risco a segurança das movimentações respectivas que interessam ao País, estando agora ao nível de 1939, bem como a proibição da empresa desenvolver negócios em Macau e na China, o que finalmente está a ser feito com 20 anos de atraso e com oportunidades perdidas que naturalmente não se repetirão.
6ºhaver uma Federação Portuguesa de Transportes, fundada se me não falha a memória pelo Eng. Silva Carvalho, que tentava bater-se por coordenar e melhorar o estado dos transportes em Portugal mas que ao findar a década de 80 foi eliminada pela decisão do então ministro do sector ter proibido as empresas públicas de a ela pertencerem.
7ºnão haver qualquer iniciativa concreta por parte das entidades responsáveis pelas actividades marítimas, principalmente o IPTM, no sentido de promover as actividades náuticas para a juventude cujo empenho no interesse concreto pelo Mar é essencial para o futuro deste País.
Esta situação teve obviamente grande influência na criação da Secção de Transportes da Sociedade de Geografia, e foi-se mantendo, e em comparação com os restantes países europeus até se degradando, apenas aumentando as conferências, os congressos, actualmente os fóruns vários, as muitas cerimónias comemorativas do passado, e a produção de inúmeros livros de cores diversas, mas concretamente nada!
No entanto logo no início destes 25 anos houve duas entidades, agora algo esquecidas pelos novos arautos da renovação do Mar Português, onde se tratou com bastante profundidade todo este assunto dos transportes e da Marinha de Portugal. Refiro-me em particular à Sociedade de Geografia de Lisboa porque a Academia de Marinha sempre esteve mais focada, como é lógico, na Marinha.
Com uma dificuldade enorme causada pelo pouco interesse da comunicação social o que diminuiu muito o desejável impacto na população que naturalmente foi recebendo pouca informação e por vezes além de pouca, deformada, só esporadicamente isto não acontecendo como foi o caso do Dr. Bettencourt Resendes hoje aqui homenageado.
A crise actual que para além da sua componente internacional tem outra, de muito maior peso, de carácter interno e de natureza estrutural e cultural que urge resolver, apresenta, para lá das tremendas penalizações a grande parte da população principalmente aos mais carenciados, uma oportunidade do tipo daquelas que só ocorrem quando um país atinge um nível muito baixo, como é infelizmente agora o nosso caso.
Assim a reestruturação do Estado, actualmente minado por erros resultantes dos rumos excessivamente estatizantes verificados durante todo este período e por conceitos de gestão pouco ou nada concordantes com os de uma gestão eficiente e transparente só será possível e rápida se houver efectiva colaboração por parte da Comunicação Social que é essencial para informar correcta e oportunamente a opinião pública pois os políticos só são sensíveis a duas forças: o voto e o dinheiro, e destas só a primeira depende dos cidadãos e é a única que pode travar a segunda.
Como sempre o Futuro depende em grande parte das nossas acções e por isso é tão importante haver uma Secção de Transportes, como esta da Sociedade de Geografia e a colaboração de um Diário de Notícias como aconteceu com o Dr. Bettencourt Resendes.
Bem hajam pela vossa atenção.
11 de Novembro de 2010
Sociedade de Geografia de Lisboa
Depois dos anteriores artigos sobre este assunto surgiram algumas dúvidas que importa esclarecer e que são as seguintes: falou-se de portos de recreio e de marinas e afinal qual é a diferença entre esta duas definições, e em qual delas devemos apostar para contribuirmos para o desenvolvimento sustentado de Tavira.
Quando se afirma que a náutica de recreio constitui um motor essencial para o desenvolvimento de Tavira a primeira ideia é haver instalações apropriadas para receber embarcações de porte médio e grande e onde se prestem todos os serviços correspondentes às 4 e 5 estrelas da classificação turística, que é obviamente a que maior valor acrescentado propicia e portanto, a que mais postos de trabalho cria e mais riqueza introduz na sociedade local.
Para isso constroiem-se marinas onde se recebem as embarcações e onde existem infraestruturas que possibilitam a prestação dos serviços atrás indicados e que se destinam aos clientes com poder de compra correspondente.
Alguns estudos de que tive conhecimento têm tratado este assunto de forma a mostrar que existe um mercado muito vasto na Europa em que a maioria dos países está a atingir a saturação das suas capacidades naturais pelo que existem fundadas convicções do sucesso deste tipo de investimento em locais como Tavira dadas as suas condições excepcionais da natureza e do enquadramento.
Mas a náutica de recreio tem outra característica essencial a saber: é um meio educativo único além dos seus aspectos desportivo e lúdico, e que é forçoso desenvolver em grande parte da população que vive na proximidade do mar, se quisermos ter a qualidade náutica exigida pelos empreendimentos náuticos de elevada qualidade que como se viu são essenciais para a criação de riqueza.
Assim teremos que ter vários portos de recreio, com infraestruturas mais baratas e que permitam a prática da náutica a grande parte da população e não apenas à juventude, pois quando isto acontece como já aconteceu no nosso país noutros locais, quando o cidadão deixa de ser jovem não pode mais praticar estas actividades.
Tavira tem pois todas as vantagens em possuir uma marina de alta qualidade mas deve também desenvolver os portos de recreio que a natureza lhe facilita a tarefa desde que se saiba aproveitar locais como Cabanas, Santa Luzia e o Forte de Santo António.
Este conjunto de equipamentos, a maior parte dos quais devendo ser investimentos privados, criarão alguns milhares de postos de trabalho, entre directos e indirectos, e contribuirão decisivamente para reduzir a taxa de sazonalidade.
De tal forma que não se pode aceitar sem revolta que o poder político continue a protelar as decisões que permitam estas realizações, tanto mais quando todos os dias aumenta o número de portugueses desempregados.
Publicado no Postal em Novembro de 2010
Desta vez não foi um leitor mas eu próprio a levantar esta questão indicada no título deste texto até porque, devo confessar-vos este desabafo, tendo iniciado esta luta pelas actividades marítimas desde 1974 tenho tido muito mais derrotas e desprezos vários que vitórias, como se pode ver pelo estado de atraso e de decadência delas no nosso País, começo a não ter grande paciência para os novos apóstolos da sua renovação que muito falam e pouco ou nada fazem de concreto mas têm o descaramento de se apresentarem como grandes inovadores sem sequer se darem ao trabalho de verificar se alguém já antes deles o fez.
Enquanto outros se esforçam por nada acontecer para protegerem iniciativas anteriores com receio da concorrência ou outros preconceitos, o que revela poucos conhecimentos desta realidade e bastante mesquinhez.
Mas para melhor esclarecimento do leitor vamos examinar, embora sucintamente como é óbvio num artigo deste tipo, os casos dos três municípios do Sotavento que indiquei no artigo anterior começando naturalmente por Tavira, depois por Castro Marim e finalmente por Vila Real de Santo António.
Tavira, tal como Portugal, deveu a sua grandeza no passado à actividade marítima e à sua produção agrícola e algumas indústrias ligadas a ambas e neste momento uma vez perdidas ou diminuídas essas actividades foi transformada nas últimas décadas num dormitório onde a maior actividade, o turismo, tem uma taxa de sazonalidade da ordem de 1,5 em 12 e é constituída pelo aberrante título de sol e praia que ainda por cima se caracteriza por baixo valor acrescentado para a sua população pois a maior parte das empresas que nele participam têm sede fora do concelho.
Para inverter esta situação é essencial o desenvolvimento de actividades que sejam passíveis de ser praticadas por pessoas individuais ou participando em empresas locais que sejam praticadas todo o ano, porque o clima e o mar assim o permitem e assim não só se resolver o problema da sazonalidade mas também o de passar a haver condições de atracão para residentes permanentes quer como reformados quer como profissionais de especialidades como por exemplo a informática.
Mas deve chamar-se a atenção que para seja possível ter a qualidade na prestação de serviços turísticos destes tipos há que cuidar da cultura específica a desenvolver na população o que obriga a criar condições para que todo e qualquer cidadão possa praticar todas elas ou pelo menos quase todas.
O que implica iniciar as crianças desde os primeiros anos de escolaridade no interesse pelos barcos, pelos animais que vivem no mar e nos campos da sua terra e não limitar os estudos aos possíveis turistas que nos poderão visitar.
Tavira tem um território onde já existem iniciativas muito interessantes e que são exemplos das enormes potencialidades existentes mas carecendo de alguns apoios operacionais que permitam a sua expansão de forma a constituírem um tecido coerente e complementar que dê ao Município a dimensão produtiva mais conveniente pois o mais importante é sempre manter o máximo nível de qualidade e não se voltar a cair no tipo de desenvolvimento como o de elevado número de fogos construídos em que a maior parte foi de baixa qualidade urbanística.
Mas quanto ao Mar as carências são ainda enormes: existem postos de atracação em número de algumas dezenas quando o potencial ronda os 2 000 distribuídos por Santa Luzia, 4 Águas e Forte de Santo António (ou do Rato), Cabanas e pelo Gilão junto ao centro da cidade onde há muito a fazer para dar vida, e receitas, todo o ano.
Ainda há mais iniciativas mas estas chegam para ilustrar o que se pretende expor.
Na verdade Tavira tem agora um Presidente do Município que está interessado nesta linha de desenvolvimento, o que de facto não aconteceu nos mandatos anteriores, e assim temos o início desta caminhada resolvido. É preciso agora que os outros intervenientes já apontados no artigo anterior se unam de forma a iniciar a concretização por fases dum plano de desenvolvimento global que deverá produzir resultados palpáveis em alguns meses.
E há quem esteja disposto a ajudar esta caminhada sem outra motivação além da vontade em conseguir colocar rapidamente Tavira no patamar de desenvolvimento sustentado e de elevada qualidade que pode e merece ter.
Quanto a Castro Marim e Vila Real também têm potencialidades de instalação de postos de amarração de idêntica capacidade, mas com características mais concentradas e praticamente sem influência na Ria Formosa mas não tenho conhecimento do interesse dos respectivos autarcas nestas iniciativas pelo que trataremos este assunto mais tarde.
Publicado no Postal em 2010-Set-23