Sexta-feira, 20 de Janeiro de 2012
Autarquias: menos ou melhores?

No jornal de 2 de Janeiro pp foi publicado no DN um artigo interessante sobre a redução de autarquias.

 

Em Julho pp também eu próprio escrevi no DN um artigo sobre as autarquias e os governos civis.

 

Julgo ser agora oportuno voltar ao tema da reorganização das autarquias pois parece haver opiniões favoráveis à sua redução embora o artigo acima indicado seja no sentido de chamar a atenção para os riscos destes cortes.

 

Correndo o risco de repetir algumas afirmações que fiz em Julho convém no entanto recordar o facto de quase todas, para não dizer todas, não terem dimensão crítica para fazer um PDM correto e custarem aos cidadãos que as sustentam bastante mais do que é justo e conveniente, pois todo o custo a mais equivale a redução da competitividade da população, e portanto do país.

 

O que escrevi em Julho já apontava para uma estratégia para diminuir os custos autárquicos mas como o seu objetivo era principalmente a ligação entre municípios e governos civis, não aprofundei como tratar as autarquias quanto ao seu número.

 

Isto é: criar mais, eliminar algumas, ou melhorar a sua eficiência?

 

1º É preciso não esquecer que há dois objetivos algo contraditórios: as vantagens do trabalho de gestão em proximidade das populações que as autarquias proporcionam, que aponta para não reduzir o seu número, e a necessidade de reduzir drasticamente os seus custos de funcionamento em relação à riqueza de facto criada, de forma a eliminar todos os focos de parasitismo que proliferaram nestas últimas décadas.

 

2º A eliminação realizada pelo governo central é um erro de gestão evitável e desgastante, e, tendo em conta o que apresentei em Julho, deve ser tratado e resolvido, no seu aspeto essencial que é o da redução dos custos, pelas próprias autarquias, associando-se e reorganizando-se.

 

Do ponto de vista de eficiência de gestão o que parece mais correto é o Governo deixar a responsabilidade da reorganização municipal, incluindo as juntas de freguesia, aos municípios, embora controlando os seus orçamentos e fornecendo a toda a população a informação completa referente à gestão da sua autarquia para lhe permitir controlar eficazmente o trabalho realizado por aqueles que elegeu, ou melhor que foram eleitos, pois quem não votou neles também tem direito a controlá-los.

 

  Publicada no DN em 19 de Janeiro de 2012



publicado por JoseViana às 16:45
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Domingo, 15 de Janeiro de 2012
Portos e transportes marítimos: do diagnóstico para os resultados

 

Tudo que havia para dizer sobre a Marinha Portuguesa, o seu estado actual, as consequências do seu enfraquecimento e como evitar esse naufrágio nacional, já aconteceu há bastante tempo e ficou agora ainda mais claro.

 

Parafraseando uma vez mais Almada Negreiros só falta mesmo é fazer alguma coisa a sério.

 

Nesta comunicação vou ser muito sintético, até porque ao  longo das três últimas décadas tive ocasião de tratar estes assuntos, muitas vezes aqui na Academia e quem estiver interessado em verificar a antiguidade de alguns temas ou o seu eventual aprofundamento poderá fazê-lo consultando um CD existente nas Bibliotecas da Academia, da Sociedade de Geografia e em breve também na da Marinha.

 

Não têm faltado conferências proferidas por pessoas altamente cotadas em fóruns da maior relevância no plano institucional português, que trataram estes assuntos muito bem, mas resultados, onde estão eles?

 

Porque para haver resultados é preciso haver decisões e acções concretas, isto é, fazer algo que não seja apenas falar ou escrever.

Fazer, com certeza, mas o quê e por quem e quando?

 

Trata-se não só de ressuscitar uma actividade mas também e mais ainda de incutir na população uma atitude diametralmente oposta à que vem vigorando no nosso país desde há quase quarenta anos, talvez ainda com maior intensidade  que nos quatrocentos anteriores.

 

E que implica vontade política e vontade dos cidadãos, em particular dos que produzem, seja qual for o grau hierárquico que ocupem, e dos que investem.

 

Importa recordar que vontade política em ditadura é muito simples de definir e quando ela não contempla determinado objectivo é escusado argumentar, até por ser proibida tal possibilidade.

 

Se esse objectivo for decidido, então apenas há que escolher quem o realizará.

 

O exemplo mais claro disto foi o célebre despacho 100 do então Comandante Américo Tomaz que permitiu Portugal voltar a ter Marinha como já não tinha há quase século e meio. Mas eram outros tempos e foi naturalmente a única solução para a crise em que se estava, e com resultados altamente positivos.

 

Já em democracia e nas circunstâncias actuais de não termos mais qualquer  império colonial,  as coisas são mais complicadas pois o poder democrático depende das eleições e se os eleitores estiverem habituados a facilidades e a habilidades,  como aconteceu nos últimos quinze anos, que os tornem pouco motivados para o trabalho e para o risco, dificilmente os políticos conseguem poder para processar alterações profundas nas atitudes dos cidadãos que, a curto prazo, parecem poder prejudicá-los.

 

A menos que haja uma crise grave e que tenham consciência dela.

 

Comecemos pois por “o quê”:

 

1º -  Que Marinha Mercante e o que ela exige

 

O mercado actual da Marinha Mercante, ou Marinha de Comércio, é global pois já não temos tráfegos protegidos e o movimento das nossas importações e exportações é pequeno e muito diversificado. Temos pois ao nosso alcance vários milhões de toneladas anuais de mercadorias “bastando” sermos competitivos para podermos participar nesse bolo gigantesco onde aliás tanto, primeiro a Nacional, como depois a Insulana estavam a penetrar em 1974. Seja no tráfego costeiro europeu, ou no internacional em geral sem esquecer a possibilidade de serem definidos transportes estratégicos que até os mais acérrimos defensores do liberalismo como são os americanos praticam sem qualquer hesitação quando estão em jogo interesses vitais do país.

 

Além disto e de vários nichos de mercado de que não é oportuno falar aqui, há o dos navios de cruzeiros que iniciou o seu desenvolvimento nos finais da década de 60, início da de 70, e que  os armadores portugueses não se aperceberam por não terem tomado atempadamente consciência da importância crescente do turismo na economia nacional. Como já tive ocasião de aqui relatar só o Funchal foi transformado em vez de ser abatido porque o Presidente Américo Tomaz a isso se opôs . Julgo ainda haver oportunidades neste sector, mas as tentativas para convencer alguns grupos hoteleiros a compreender que é uma extensão lógica da actividade hoteleira corrente nunca tiveram qualquer êxito. O que está dentro das tradições empresariais portuguesas pois não se pode, em abono da verdade, acusar apenas o poder político de estar de costas para o Mar porque os privados têm feito exactamente  o mesmo.

 

Para que haja Marinha Mercante, e por muito lapaliciana que pareça ser a afirmação seguinte, é preciso haver empresas de navegação motivadas e competitivas. Para isto ser possível  é indispensável existir um enquadramento legal e operacional que permita essas empresas operarem de forma a que a bandeira portuguesa seja muito conveniente sem ser de conveniência, o que exige por exemplo o registo de aquisições e abates ser imediato e sem qualquer necessidade de autorização, e não como a carta de marinheiro ou de condução de ligeiros que levam meses a ser tratadas, os assuntos jurídicos terem tratamento como em Londres ou outras praças onde um arresto se pode resolver em horas e não em meses, os assuntos relativos a tripulações idem e por aí fora, até á realização de contratos e à legalização das próprias empresas passando  por questões fiscais, tudo isto dentro dos condicionamentos  europeus, que são muitos, mas não impedem países como a Dinamarca de serem grandes potências marítimas.

 

Não cabe no âmbito desta apresentação pormenorizar todo este sistema de enquadramento mas já há muito trabalho feito, em particular na Secção de Transportes da Sociedade de Geografia e há  mais pessoas muito bem preparadas que em poucos meses tornam  possível ter este trabalho pronto.

 

Aqui convém recordar algo que já tive ocasião de tratar em comunicações anteriores e que tem a ver com  a falta de empresários nacionais interessados neste sector. É uma questão que já é velha de pelo menos quase três séculos: quando o Marquês de Pombal quis industrializar os País teve que ir buscar ao estrangeiro os que não encontrava cá.

 

 

Agora a solução será diferente e por ventura mais fácil: basta considerar como empresa portuguesa aquela cujos sócios sejam residentes em Portugal, provavelmente com alguma restrição relativa a serem europeus, se for caso disso. É aquilo que em tempos aqui  apresentei como o residencialismo.

 

2º  - Que Marinha de Recreio e o que ela exige

 

De acordo com um estudo realizado pela FIN ( Federation des Industries Nautiques ) baseado no período 1977 a 2002 a Marinha de Recreio mundial cresceu, em média, 7% anualmente, sendo a parte relativa à vela de 12% contra 6.4% relativa à motorizada. A totalidade de barcos produzidos em 1977 foi 6175 unidades e em 2002 atingiu 8708 unidades mas o problema maior continua a ser  a dos postos de atracação que só em França atingem o valor, insuficiente, de 226 000 lugares.

 

Também tem interesse recordar um estudo realizado na Comunidade Europeia indicando ser a Marinha de Recreio responsável pelo aparecimento de mais de 180 novas profissões ao longo destes últimos anos.

 

A costa portuguesa é aproximadamente metade da francesa mas o número total de postos de atracação aqui existentes é uma percentagem exígua da francesa e  da que é possível e exigível, tanto mais que grande parte, senão mesmo a totalidade poderá ser realizada por investidores privados libertando assim o Estado para outros objectivos que só ele pode e deve realizar.

 

Como exemplos apenas apresentarei, muito sinteticamente é claro, os casos de Lisboa e do Sotavento Algarvio: no primeiro a capacidade prevista para o estuário do Tejo foi estimada em 1982 em cerca de 20 000 e no segundo a previsão realizada recentemente aponta para cerca de 5000 sem incluir Faro. Recordo-me de um projecto para a zona que vai de Algés até à Gibalta apresentado há cerca de vinte anos, à então AGPL, para se construir uma marina para perto de 2000 postos de atracação mas que esta Administração achou que poderia ser aceitável mas que poderia haver ideia melhor, pelo que lançou um concurso tão bem feito que ficou deserto e agora está lá o que se vê. Também em 1998 se propôs à Câmara Municipal do Barreiro, durante uma comemoração relativa ao papel desta cidade nos Descobrimentos ali  realizada por esta Academia, o aproveitamento da bacia do Coina para instalar um porto de recreio para 3 a 4000 postos de atracação e assim tornar aquela cidade no mais importante centro  de náutica de recreio nacional e criando numerosos postos de trabalho relativos às muitas actividades induzidas pela existência daquela infra-estrutura.

Nada aconteceu.

 

E agora , quando finalmente Portugal redescobre a existência entre Lisboa e Cascais de uma das melhores zonas para a prática de regatas de vela do Mundo, mas foi preciso haver como sempre uma opinião estrangeira, vê-se finalmente desenhar-se algum interesse por este sector mas não o suficiente para imediatamente se dar corpo a todas as iniciativas que poderiam e deveriam já ter sido realizadas e que serão sempre rentáveis haja ou não a taça da América aqui sediada.

Mais ainda porque a única razão que poderá levar os decisores suíços  a não optarem por Portugal poderá ser a de não termos aqui infra-estruturas  náuticas para acolher os milhares de  veleiros que, tal como aconteceu na Nova Zelândia recentemente, querem assistir a este acontecimento maior da vela mundial.

 

As dificuldades de decisão que existem neste sector derivam da dispersão dos centros de        

decisão por vários Ministérios entre eles o do Ambiente, em que a prática vem mostrando ter como norma de comportamento: “nada se autoriza tudo se consente”, e o que regula os Portos onde as prioridades não têm apontado para este sector, dando preferência a restaurantes, lojas de automóveis e outras actividades pouco náuticas, além de edifícios de escritórios que podiam estar na avenida Elias Garcia ou em qualquer outra do centro da cidade.

 

Enquanto a maior parte das nossas  ONGs  interessadas na defesa do ambiente mostram muito mais actividade em relação a alguns pássaros ou outros animais do que aos milhões de portugueses que cá vivem.

Também aqui há que rever os enquadramentos de forma a haver melhor operacionalidade burocrática e fiscalização mais efectiva de forma a evitar, pelo menos, a indisciplina e os riscos de acidentes.

 

3º  - Que portos e o que eles exigem

 

Sobre este tema prefiro nada dizer para além do que já foi dito durante os painéis realizados em Junho passado. A notícia dada pelos media de que tinha sido encomendado um estudo à empresa consultora espanhola  que fez o mesmo estudo para Espanha, para mim , elimina a possibilidade e o interesse em tratar agora esta tema.

 

E agora, por quem e quando?

 

Posto o que atrás se disse  e, como parece haver vontade política, o que até agora não se verificou, antes pelo contrário houve Governos que se encarniçaram no ataque a quem queria que Portugal tivesse Marinha, vamos sugerir sejam tomadas decisões que permitam rapidamente mudar o rumo que tem vindo a ser seguido desde há quase 30 anos.

 

Embora eu próprio, e aqui mesmo, tenha, já lá vão alguns anos, apresentado várias notas sobre este tema, julgo no entanto mais pertinente e eficaz referir o relatório, recentemente elaborado por encomenda do Governo ao McKinsey Global Institute, em que sobressaem nas causas das dificuldades da competitividade nacional os procedimentos praticados pelos serviços do Estado e que são obviamente da responsabilidade dos Governos todos destes mesmos últimos 30 anos. É claro que o actual não sendo responsável pelos erros dos anteriores é o único que pode agora aplicar as correcções necessárias.

 

Portanto deverá, imediatamente, ser nomeado um responsável por um grupo de trabalho, para cada um dos temas aqui tratados, constituído por pessoas conhecedoras dos problemas focados e com provas dadas nestas actividades e principalmente das soluções  apresentadas anteriormente,  obviamente  integrados na Comissão Estratégica dos Oceanos, para em prazo muito curto a ficar claramente definido, apresentar todos o diplomas e decisões a tomar pelo Executivo para o mais rapidamente possível se alterar o rumo de colisão em que  vamos navegando.

Porque são dois temas que se podem começar a tratar já, sem haver o perigo de porem em cheque seja qual for a definição estratégica que será definida em 2004 e com a vantagem de contribuírem para criar rapidamente muitos postos de trabalho e darem uma nota de optimismo aos portugueses ultimamente tão causticados por más notícias e desastres, mesmo tendo em conta os exageros e as distorções dos media nacionais e estrangeiros.

 

Além do efeito político que representa haver agora investimentos de grande porte quando a Ministra das Finanças não tem possibilidades de aumentar o investimento público.

Diz a voz do povo que o óptimo é inimigo do bom e temo que, ao se pretender elaborar uma estratégia abrangendo tantas actividades, se atrasem escusadamente aquelas que já sabemos como desenvolver e que cujo atraso pode por em perigo a decisão favorável da Taça da América.

 

Como já vimos, mas convém insistir, a quase totalidade do  investimento necessário é privado, pois já vai sendo tempo para que se torne possível ser investidor em Portugal sem que o Estado tenha que pagar os lucros aos investidores como foi moda alguns anos atrás, pelo que não é preciso esperar pela melhoria das finanças públicas mas  é forçoso acelerar, para as  melhorar.

 

Vós, ou pelo menos a maioria de vós, que sabeis melhor do que quaisquer outros a arte e os preceitos correctos da navegação , compreendeis a semelhança do nosso País com um navio em rota de colisão e em que o seu Comando vai adiando a aplicação de soluções, elaborando mais estudos e esquecendo estudos já feitos, em vez de tomar as decisões certas, como disse Peter Drucker, poucas mas boas.

 

E também  podeis prever o naufrágio fatal que se seguirá se tal  procedimento não for imediatamente iniciado como foi apresentado, de forma a corrigir  o rumo errado em que navegamos há tempo demais.

 

Academia de Marinha, 23 de Outubro de 2003

Simpósio “O Mar no futuro de Portugal”

 



publicado por JoseViana às 17:01
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Portos e Transportes Marítimos

Comunicação apresentada na Academia de Marinha, em 17 de Junho de 2003,

 

 

Antes de entrar no tema da minha participação neste painel quero pedir  a vossa atenção para uma nota prévia: dados os objectivos desta série de painéis  e o facto de os assuntos aqui tratados já terem vindo a ser abordados desde há largos anos vou concentrar a minha comunicação em alguns pontos essenciais que facilitem o seu desenvolvimento dentro dos objectivos deste ciclo de painéis.

 

1º - Portos / Transportes marítimos


Em primeiro lugar interessa explicar porque razão se apresentam os portos

separadamente dos transportes marítimos ao contrário do que aconteceu entre nós nestes últimos anos quanto à sua dependência governamental consubstanciada no Instituto Marítimo-Portuário.

 

Até 1974 os assuntos portuários eram tratados pela Direcção Geral dos Portos, dependente normalmente do Ministério das Obras Públicas enquanto as Marinhas Mercante, da Pesca e de Recreio estavam dependentes da Armada.

 

Na realidade um país pode ter vários portos e estes serem de elevada qualidade e ter uma Marinha fraca, como ter uma Marinha forte e ter portos sem expressão internacional.

 

São duas realidades ligadas mas não obrigatoriamente interdependentes, pois o relacionamento com os vários  intervenientes é diferente como muitos destes também o são.

 

Ora um porto é um interface do Mar, isto é, das actividades ligadas ao Mar, com todas as actividades situadas no que se costuma chamar o seu hinterland.

 

Por outro lado a Marinha  - em sentido lato – engloba um variado número  de actividades que ultrapassam largamente os aspectos relacionados com os transportes e com a economia, pois constituem um conjunto de actividades estruturantes particularmente importantes para países como Portugal onde se tornaram essenciais para garantir a sua independência e que foram as bases para poder ter sido o iniciador da globalização e que, quanto aos transportes marítimos, pode até ser muito desenvolvida sem todavia existirem portos nacionais de grande dimensão. E isto porque a sua actividade se exerce em tráfegos internacionais como acontece com a Dinamarca, a Noruega, a Grécia, e outros.

 

Em 74, após uma revolução caracterizada como a maioria de todas as anteriores, com excepção da de 1383, i.e, mais perdida por quem detinha o poder que ganha por quem a iniciou, surgiu um complexo a nível nacional, com origens curiosas, de que Marinha significava colónias logo colonialismo e este implicava fascismo, logo actividade altamente pecaminosa.

 

Assim passámos instantaneamente de um Estado em que havia unidade de gestão da Marinha como actividade estruturante essencial, para outro, em que foi desmembrada e entregue, a parte civil, a gestores, quase todos, tecnocratas com visão restrita, poucos conhecimentos e muitos preconceitos e sem haver qualquer estratégia nacional onde se enquadrasse.

 

O resultado está à vista: o afundamento patente da Marinha portuguesa em todos sectores que a compõem.

 

Esta casa – a Armada – é o último  reduto para a sobrevivência da Marinha Portuguesa como já tive ocasião de, aqui mesmo, o afirmar mais de uma vez.

 

2º - Os portos nacionais


Os portos são, pois, na sua essência os sistemas de interface mar-terra que deverão permitir operar uma gama bastante vasta de actividades praticamente todas de carácter estruturante em particular quando se trata de um país de orientação essencialmente marítima como foi Portugal até há alguns anos atrás.

 

As actividades mais importantes a praticar nos portos são assim: entrada e saída de mercadorias e passageiros através de navios, pesca empresarial  e desportiva, navegação de recreio desportiva e de turismo, instalações de construção e reparação naval e  de segurança (militares, salvamento, vigilância, soberania, etc.) e ainda as actividades industriais/comerciais que para serem competitivas a nível global devam aí estar situadas.

 

As características dos portos exigidas pelas várias actividades são naturalmente mais diferentes em dimensão que em natureza, pois em todas elas há três condições  essenciais: acesso ao mar, acesso ao hinterland, terraplenos para estabelecer o inter face eficazmente.

 

Como a maior parte da economia de um país depende da competitividade dos seus portos para conseguir exportar o que precisa vender e importar o que precisa consumir  pelo mais baixo custo, em primeiro lugar devemos contemplar os portos comerciais que são os mais exigentes nas três características essenciais que , aliás, poucos portos portugueses possuem.

 

Convém no entanto especificar um   pouco mais dois tipos de transporte marítimo que implicam diferentes exigências portuárias: longo curso e costeiro. O primeiro exige fundos nos cais, nos canais de acesso e nas bacias de manobra bastante generosos, embora dependentes dos tipos de navios que se prevê utilizar, enquanto o segundo utiliza navios de menor porte que lhes permita o acesso a muito mais portos e assim efectuar a distribuição por via marítima, evitando o uso do meio rodoviário pesado sempre que possível e em complemento com o ferroviário e o fluvial que são os meios menos  poluidores e mais económicos do ponto de vista energético.

 

Em Portugal os portos de longo curso poderão ser Sines, Setúbal, Lisboa, Leixões embora alguns destes com limitações.

 

Os costeiros (short sea) poderão ser Vila Real de Santo António, Faro, Portimão, Sines, Setúbal, Lisboa, Peniche, Figueira da Foz, Aveiro e Viana do Castelo.

 

A característica mais importante dos portos, estando garantida a segurança indispensável , é serem essenciais para a competitividade do país pois sendo os portos  a entrada e a saída da maioria das mercadorias que importamos e exportamos, da sua eficiência dependem os custos das importações e as margens das exportações. E ainda a efectividade das actividades como a marinha de recreio que desde sempre devia ter sido tratada como merecia mas que, agora com a possibilidade de acolher a realização da taça da América, se verificam os erros de princípio e de dimensão que têm vindo  a ser cometidos ao  longo da nossa costa.

 

Esperemos que os atrasos de nossa responsabilidade não venham a anular as vantagens naturais que temos por estar colocada entre Lisboa e Cascais uma das melhores zonas para a prática de vela oceânica do mundo, até agora tão mal aproveitada.

 

 

Quanto ao movimento de mercadorias os valores das movimentações nacionais rondam, entre entradas e saídas, 55  milhões de toneladas anuais num volume mundial de 12 000 milhões o que nos deve dar a consciência das proporções e dos mercados que estão em jogo quando se tomam decisões estratégicas para o País.

 

Por outro lado a maioria dos nossos portos têm terraplenos muito pequenos e acessos ao “hinterland” pouco eficazes até porque o nosso país nunca teve um sistema de transportes mas apenas impulsos reformadores parciais, portanto não sistémicos como devia ter sido realizado. Impulsos esses que actualmente produzem projectos de  aeroportos e de comboios caríssimos e mais ou menos mirabolantes, em vez de sistemas de transportes realmente efectivos na sua contribuição para a competitividade nacional.

 

Para termos ideia das devidas proporções devemos recordar que alguns portos do norte da Europa têm dezenas de milhar de hectares de terraplenos contra apenas algumas dezenas do nosso de Lisboa, que é dos melhores que temos, e os volumes de tráfego ( da ordem das centenas de milhões de toneladas anuais) que neles se verificam não autorizam grandes expectativas de ligações trans-europeias, devendo nós ficarmos pelo hinterland natural que é mais ibérico que europeu.

 

Quanto à marinha de recreio tem sido desprezada pelas administrações portuárias e pelos ministérios de que dependem como é exemplo flagrante o de Lisboa : estudos realizados há cerca de vinte anos determinaram que Lisboa devia ter pelo menos cerca de 20 000 postos de atracação quando afinal anda ainda pelos dez por cento. E o que é mais grave é estarem a ser ocupadas áreas apropriadas para estas e outras actividades marítimas com edifícios que poderiam estar algures ou como a torre inclinada em sítio nenhum.

 

Em conclusão, é indispensável uma revisão de todos os portos portugueses, e de toda a costa,  com critérios de competitividade como atrás se apontaram não só para preservar o ambiente mas também para avaliar o que se pode e deve fazer para desenvolver actividades estruturantes e não apenas casinos e restaurantes, que podem dar jeito, mas não o são.

 

E não apenas para salvar o ambiente, o que é importante, mas também para salvar o País da mediocridade, o que não é menos importante.

 

3º - Transportes marítimos


Transportes marítimos ou marinha mercante foi a actividade que os portugueses desenvolveram e lhes permitiu terem sido os iniciadores da globalização.

 

Na verdade trata-se de grande simplificação pois o que nós, i.e., os portugueses do  século XV criaram foi o poder marítimo global.

A evolução do tráfego marítimo mundial está expresso na curva seguinte:

 

 

Actualmente atinge cerca de 6 000 milhões de toneladas o que significa que o movimento nos portos de todo o  mundo ronda 12 000 milhões de toneladas o que coloca as nossas poucas  dezenas de milhões de toneladas no nível da realidade que é.

 

O nosso tráfego próprio não chega para base de qualquer frota nacional  importante ainda por cima se tomarmos em consideração a diversidade de origens e destinos.

A única solução, que estava já em evolução em 1974, era desenvolver o negócio de ser terceira bandeira como fizeram alguns países, conforme atrás indicámos, o que exige aos empresários respectivos grande capacidade empresarial e um enquadramento extremamente competitivo, que nunca  tiveram entre nós excepto até 1974 quando imperava a protecção de bandeira entre os territórios portugueses, aliás como hoje se processa em países que são considerados como muito liberais.

 

Enquadramento que engloba financiamentos, custos sociais, fiscalidade, justiça muito eficaz, burocracia ágil e eficiente...

 

Em resumo quando se fala sobre transportes marítimos o mercado que interessa considerar para efeitos estratégicos é o global.

 

É claro que tem que se olhar  também para o nacional: não tem qualquer sentido que se transportem cargas como cimento, combustíveis e outras entre portos nacionais por estrada e não se use a via marítima só porque os portos são tão pouco competitivos que os empresários são obrigados a escolher opções erradas por serem as melhores possíveis.

 

Mas não é só no transporte de mercadorias que se verificam estas anomalias. No transporte de passageiros quando surgiram os aviões a jacto, que permitiram melhorar as viagens de longo curso da forma conhecida, os navios de passageiros tradicionais ficaram irremediavelmente condenados. Os armadores mais atentos e empreendedores transformaram-nos em navios de cruzeiros dando origem aos actuais hotéis flutuantes que todos conhecem. Os armadores nacionais venderam-nos todos,  salvo temporariamente o “Funchal” que logo no primeiro ano de operação se revelou capaz de gerar lucros, mas que logo a seguir foi alienado a armador grego, depois de ter acumulado prejuízos por má gestão. Diga-se de passagem que só não foi vendido, porque nesse tempo o então Presidente da República, Alm. Américo Tomás, a isso se opôs.

Anos mais tarde tive conhecimento de ter sido proposto a um dos maiores hoteleiros portugueses a constituição de uma empresa de navios de cruzeiro, como complemento das suas actividades em terra e com os incentivos de aumentar as motivações para manter clientes na sua influência pela oferta de mais este serviço, e ser possível investir com muito menor necessidade de capital, dadas as condições excepcionais de financiamento que então ofereciam os estaleiros construtores. Sem qualquer consequência positiva.

 

Hoje somos visitados por inúmeros navios mas nenhum é português.

 

É claro que não é  tarefa fácil competir neste mercado global que nós próprios fomos os primeiros a desenvolver. É bastante mais aliciante ganhar uns dinheiros em subsídios se possível utilizando mão de obra importada barata e em pouco tempo, já que nesta alternativa o período de fertilidade dos negócios é de quatro anos e na alternativa competitiva não tem prazo pré definido.

 

Como sempre o desenvolvimento passa pelo dinamismo do binómio poder empresarial/poder político.

 

4º Mudança de rumo ou colisão


Antes de acabar quero deixar uma nota de esperança, pois dizer de optimismo seria demais para quem anda, há cerca de trinta anos, nesta luta inglória a favor de uma estratégia nacional virada para o Mar, e em que o único sucesso dessa luta é estar aqui hoje convosco, estratégia essa que não seja estar sentado num restaurante à beira dele, e que é a seguinte: temos pessoas capazes e com trabalho já feito, algumas delas aqui presentes que poderão, assim que houver vontade política, preparar, em pouco tempo, a revisão de todo o enquadramento legal que é indispensável, com a certeza que não é preciso sobrecarregar o erário público, pois será mais o que entrará que o que sairá dele.

 

Muitos destes trabalhos foram entregues oportunamente a quem de direito mas nada aconteceu para além do silêncio e da quietude dos cestos de papéis.

 

Devo dizer-vos que tenho conhecimento de alguns projectos nesta área de actividades marítimas, atingindo valores da ordem de algumas centenas de milhões de euros, que só não estão a desenvolver-se porque não há interlocutores com poder de decisão para que isso aconteça.

 

Quanto à nossa fragilidade empresarial, ainda mais agravada pelas mal denominadas nacionalizações, só poderá ser ultrapassada por um esquema idêntico ao pombalino e que hoje cada vez mais se justifica para equilibrar os efeitos da globalização, já que combatê-la não passa de tolice, como a que seria se quiséssemos combater a gravidade.

 

Trata-se de um princípio de gestão de cada país, denominado residencialismo, ou até de cada região conforme as respectivas dimensões, que defina determinadas actividades só poderem ser exercidas por empresas cujos sócios sejam obrigatoriamente nelas residentes: como exemplos de actividades a incluir nesta categoria temos a distribuição de água, de electricidade, de gás, de telefones, de transportes marítimos, aéreos, ferroviários e rodoviários, etc..

 

A aplicação deste princípio evitaria as complicações das “golden shares” e dos receios de o país perder o controle de actividades estruturantes e essenciais à sua segurança.

 

Se se corrigirem os desvios apontados e se seguirem os princípios correctos ainda devemos ir a tempo de evitar a colisão que já espreita, não longe da nossa vista.

 

Assim seja.



publicado por JoseViana às 16:49
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Terça-feira, 3 de Janeiro de 2012
Autarquias e a eficiência do seu serviço cívico

1º-As Autarquias são uma peça essencial na gestão da coisa pública dada a sua proximidade com os cidadãos que são os seus “clientes” e os eleitores que elegem quem as dirige conferindo-lhes assim toda a legitimidade democrática.

 

2º-A experiência mostrou claramente que as Autarquias, tal como até agora estavam organizadas, não são sustentáveis e, na maioria dos casos, não têm dimensão crítica suficiente para exercerem algumas funções fundamentais como por exemplo desenvolverem os PDMs, atividades culturais, e outras.

 

O aumento dos impostos para se tentar atingir o nível de sustentabilidade indispensável será um encargo inaceitável para os cidadãos e portanto totalmente inoportuno e errado.

 

3º-A fraca utilidade dos Governos Civis, estrutura pouco democrática herdada da ditadura, foi agora finalmente enfrentada pelo Governo sendo pois necessário reestruturar as suas funções.

 

4º-O mito da regionalização, já mais que uma vez combatido mas de vez em quando ressuscitado, não passa de perda de tempo em termos de processo eficaz de reorganização só se explicando esse interesse ocasional por deficiências de formação em gestão daqueles que o exprimem, e portanto é para esquecer.

O País precisa de ser eficiente, não de ser regionalizado, quanto mais não seja porque a nossa dimensão já é de uma região, o que está é mal gerido.

 

5º-A organização do País em distritos tem uma tradição que vale a pena analisar e que aliás é seguida por vários partidos políticos com bons resultados o que conduz a uma solução lógica para os problemas atrás referidos, a saber:

 

5.1-Em cada distrito as Autarquias elegem um Presidente Distrital que em conjunto com um Conselho constituído pelos seus Presidentes será responsável pelo PDM do distrito e portanto pelo PDM de cada município, e por outros serviços que deixam de onerar cada município, melhorando assim a sua eficiência, sem prejudicar a relação de proximidade com os cidadãos.

 

5.2-Este Presidente Distrital, será uma pessoa residente no distrito, não sendo acumulável com uma Autarquia.

 

5.3-As reduções nos quadros de pessoal que tal reorganização fatalmente acarretará às Autarquias poderão e deverão ser rápidas mas progressivas de forma a permitir absorver esses excedentes através do desenvolvimento de atividades produtivas, muitas vezes dependentes de decisões das próprias autarquias. Incluindo a reestruturação das Juntas de Freguesia que deverá ser realizada pelas Autarquias e não pelo Governo Central pois doutra forma nunca mais se inicia a necessária descentralização.

 

Lisboa, 11 de Julho de 2011

Publicado no DN em 28 de Julho de 2011



publicado por JoseViana às 15:20
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