O artigo publicado no DN de 14 de Julho pp intitulado “A globalização começou a surgir com Colombo” motivou-me a escrever este texto a fim de esclarecer este tema pois sendo muito incompleto e podendo dar origem a se pensar que foi Colombo quem iniciou a globalização, no entanto não se pode dizer que está totalmente errado.
Na verdade o que se passou foi (muito resumidamente) assim:
Em 1383-1385 a revolução, apoiada na burguesia de Lisboa e do Porto uma vez que a nobreza estava maioritariamente a favor de D. João de Castela, colocou no trono D. João I, Mestre da Ordem de Avis e filho de D.Pedro I, e em 1415 foi iniciada a expansão portuguesa, que logicamente só podia ser para o mar, com a conquista de Ceuta.
A seguir foram realizadas navegações não só para o sul ao longo da costa de África mas também afastando-nos progressivamente da costa como se pode constatar com a descoberta de Porto Santo em 1418, cuja distância ao continente ronda os 1000 km e mais tarde, entre 1427 e 1452 dos Açores, cuja distância ao continente ronda os 2000 km.
Entretanto em 1482 construiu-se S. Jorge da Mina e em 1483 chegámos ao Rio Zaire.
E no Atlântico norte em 1472 Corte Real chega à Terra Nova o que não espanta pois a distância dos Açores até lá ronda os 2500km e mostra que os portugueses foram durante todos estes anos coligindo conhecimentos sobre os ventos e correntes que lhe propiciaram estas viagens.
Chegamos assim à década mais notável da nossa história. Em 1487 Bartolomeu Dias inicia a viagem que lhe permitiu passar para o Oceano Índico e garantir deste forma a ligação marítima com a Índia.
Note-se o facto essencial que frequentemente é esquecido: até aqui os navios utilizados eram caravelas, que permitiam bolinar mas tinham pouca capacidade de carga, e Vasco da Gama em 1497-99 inicia a ligação com a Índia com naus, que obrigavam a ter conhecimento dos ventos e correntes do Atlântico sul.
Para conseguir este conhecimento foi preciso explorar esta parte do oceano o que implicou o envio de expedições a partir de 1488 e assim descobrir as costas setentrionais da América do Sul.
A estratégia de D. João II foi claramente a de aproveitar o avanço de Portugal sobre a Espanha no que se refere a capacidade náutica e utilizar Colombo para levar os espanhóis para a América Central deixando o Atlântico sul livre para os portugueses poderem chegar à India. Não foi por sorte que na fixação do meridiano do tratado de Tordesilhas D, João II exigiu mais 500 léguas para ocidente de forma a incluir o território brasileiro e mais tarde Pedro Álvares Cabral encontrar em porto Seguro onde fazer aguada quando foi tomar posse do Brasil.
Também não foi por algum passe de magia que o planisfério de Cantino feito em 1502 inclui a costa do Brasil e inúmeros factos impossíveis de realizar em apenas dois anos.
No entanto apesar de todos estes factos e indícios serem esclarecedores da verdade e haver historiadores conceituados que defendem a origem de globalização ser portuguesa e considerarem Portugal como a ponta de lança da expansão europeia em Portugal nunca se deu a estes factos a devida importância.
Muitos livros de História publicados em Portugal mal falam deles e enquanto a Espanha tem estátuas de Colombo em quase todas as cidades e quando celebraram as comemorações da viagem de Colombo construíram uma frota idêntica e percorreram todo o mundo propagandeando a sua importância, nós construímos uma caravela para comemorar a viagem de Bartolomeu Dias com a contribuição da África do Sul e quanto à viagem de Vasco da Gama nada se fez.
Inclusive um relatório da CMOI de 1998 com a colaboração de entidades portuguesas diz que Colombo foi o primeiro navegador oceânico.
A tentativa de aproveitar as comemorações de 1998 para recuperar o estaleiro da Azinheira Velha no Barreiro e a Capela de Santo André onde D. Manuel I assistiu ao lançamento à água das naus de Vasco da Gama esbarrou no mais completo desinteresse dos responsáveis.
Nas comemorações na Expo 98 o valor da epopeia dos descobrimentos portugueses foi totalmente esquecida e daí para cá, só agora parece haver sinais de se querer dar às atividades marítimas o seu real valor quer do melhor que tivemos no passado quer no mais prometedor que temos para o futuro.
Mas não esqueçam esta verdade: quem primeiro conheceu o oceano atlântico foram os portugueses e todos os outros europeus foram atrás de nós. Está na hora de corrigir o rumo, falarmos menos e realizarmos mais e melhor.
Lisboa,20 de Julho de 2012
Publicado no DN em 5 de Agosto de 2012